Day-to-Day

Paraguaio – Ep2 – Cinema em Ruínas.

August 7, 2011

Acordamos poucas horas depois, às 6h, para receber o café da manhã direto na escola. Esse era o último dia de aula das crianças, portanto, à noite, poderíamos ocupar mais salas/quartos. O café, meio de graça meio comprado, vinha da Padaria Cidade, também ali perto. Partimos então para o centro, um emaranhado de ruas estreitas e motoristas loucos – barbeiros? – para entrarmos no Cine São José, fechado há uns oito anos, e em decomposição.

A parte da bilheteria ainda estava relativamente inteira, apesar de empoeiradíssima e entupida de entulhos. A sala de exibição, por sua vez, era incrível. 1500 lugares. Abandonados. Uma parte do teto já tinha desabado, a metade da frente ainda continuava lá, com uma única função: o maior viveiro de pombos que eu jamais imaginei. No silêncio, a gente só ouvia o arrulhar das aves, e um constante bater de asas. Bosta de pombo espalhava-se por toda a sala, e caía do teto, ocasionalmente, em alguns lugares premiados.

Descarregamos os carros e a caminhonete, e armamos nossa base na bilheteria. Pela manhã, filmaríamos tudo dentro da sala, e mais tarde, moveríamos a base, para filmar na bilheteria. A loucura era: 32 planos num dia. Gu e Lola já estavam fazendo multi-câmeras desde o começo do filme, com uma 5D e uma 7D, mas eu e Cogo dobramos a brincadeira, trazendo mais duas 7Ds. Então, na maioria do tempo, era um plano previsto rodando, e pelo menos mais um sendo roubado, por quem quisesse. Cogo já entrou na brincadeira se lascando e foi escolhido pra ser um dos capangas da cena. Eram 3.

A Mel – Fernanda Sanches – só poderia chegar mais tarde, então a May fez uma ordem do dia que previa que a gente rodaria todos os planos sem ela primeiro, e depois os que ela aparecia, afinal, ficar parado, com tantos planos pra fazer, é suicídio.

Esperamos um pouco pelos capangas, que chegaram das mais diversas partes. Queria apresentar cada um deles, mas a memória não tá tão boa assim. O outro personagem da cena era o Homem Sombrio, papel de Heric Alvarez, que perseguia Mel dentro do cinema, com seus capangas, a mando de Ferreira.

Como o lugar tinha dois andares, deu pra roubar uns planos bem interessantes lá de cima, que não estavam previstos na decupagem original, mas que funcionam muito bem!

Enquanto esses planos eram rodados, minha missão era pendurar uma PL por dentro de um buraco no banheiro. O banheiro em si era um buraco escuro e empoeirado, com uma única entrada de luz, uma espécie de chaminezinha, por onde passaríamos as cordas pra prender o refletor. Assim que Cogo saía de cena, ele corria pro segundo andar comigo, a gente pulava uma janela e começava a dar nós, usando uma corda quilométrica que encontramos na caminhonete. Fazendo a sustentação e dando instruções, do lado de baixo, estavam a Fran (Vanessa Silva, AV10) e o Victor Rzepian (AV10). Conseguimos, depois de muita criatividade nos nós. Para vocês terem idéia da escuridão do lugar, temos um frame da versão demo da cena, rodada de dia, sem nenhuma iluminação extra, só puxando na ISO. Seguido disso, um frame da cena filmada, com a PL.


Entre os truques do dia, tivemos também uma dupla exposição, onde filmamos uma parte da cena com a iris da câmera adequada à parte mais luminosa da imagem, e depois, um tempinho com a iris mais aberta, para conseguirmos detalhes da parte escura, no caso, as poltronas. A foto abaixo já é um preview de como deve aparecer no filme.

Saímos pro almoço num restaurante próximo (realmente não sei o nome!), com a equipe toda reunida, pois a Mari conseguiu um desconto legal pra gente por lá, e acabamos almoçando a comida deles em praticamente todas as diárias. Voltamos para mais algumas coisas dentro da sala de exibição e tivemos um grande desafio ao transpor a base (praticáveis de arte e câmera) para dentro da sala, a fim de limpar a bilheteria. Na conta da Mari Chiaverini, temos esse tiro na cabeça, do primeiro capanga a perecer pelas mãos de Mel Cortez, que continua invisível.


Agora era hora da primeira parte, cronologicamente falando, dessa cena, quando os capangas e o Homem Sombrio entram no cinema para procurar a garota. E depois, a terceira parte, quando o último dos capangas foge, e continua sua busca, no andar de cima. Quando terminamos de rodar, já eram quase 18h, e mesmo as PLs não deixavam as cenas com cara de diurnas. Faltaram então três planos.

Dentre tantos desafios e problemas, o que mais me irritou, entretanto, nessa diária, foram as pombas. Na decupagem era previsto um plano de pombas voando, quando o primeiro capanga morre, vítima de um tiro. Lá fui eu, com a Gabi (AV10) para o segundo andar, aberto, com a espingarda de chumbinho e a câmera pronta. O resultado vocês vêem em vídeo, que é melhor para explicar, do que palavras.

Depois voltamos para o hotel… ops, escola, e reorganizamos os quartos, por toda a duração das férias dos moleques. No nosso, éramos eu, May e Cogo, sempre os primeiros a acordar. Fomos todos dormir cedo, quase jogando as roupas no lixo, por exposição prolongada aos pombos do inferno. Pode até ter sido frescura, mas não usei mais o casaco dessa diária até ele ser lavado… Para jantar, o lanche mais pedido foi o X-pombo!