Day-to-Day

HFR, O Erro.

December 27, 2012

Fui ver O Hobbit no IMAX pouco antes de vir pra Salvador, com a May, e achei o filme sensacional. Desisti de todas as minhas críticas sobre o livro curto ter sido dividido em três filmes e gostei muito do clima, do 3D, do som e da forma que a história foi contada. Minha maior ansiedade em relação a ele, porém, não foi resolvida: e os 48fps que Peter Jackson tanto alardeou, que seria uma revolução no cinema? Só quando a sessão começou, que não senti diferença, é que percebi que minha versão era de 24fps.

Na vibe Tolkien, reassisti a trilogia do Senhor dos Anéis, versões extendidas, e me diverti a valer. Foram mais horas de filme do que eu tinha de aulas por semana nesse último semestre. Pra completar a festa, anteontem fui ver o tal do Hobbit HFR (high-frame-rate).

Não vou falar do 3D, que é um dos melhores que já vi, mas esse HFR não me desce. Também não vou me alongar explicando tecnicalidades e vou me restringir a dizer que o padrão cinematográfico é de 24 quadros por segundo. Na TV são 30. Na cabeça de Peter Jackson, O Hobbit em 48fps só traz vantagens. Há mais foco, menos borrão de movimento, mais sensação de realidade e imersão no filme. Dessas quatro, três são verdadeiras, mas a última é redondamente oposta.

Durante os primeiros quarenta minutos, me senti vendo um making of onde os equipamentos estavam escondidos, e TUDO ACELERADO. As ações todas parecem acontecer estupidamente mais rápidas que na realidade, só que isso é uma mera ilusão, porque o som não sai de sincronia. Realmente, tem foco pra cacete, e detalhe até o infinito, mas isso prejudica o filme. É possível desconfiar dos objetos de cena, eles parecem falsos, e não pareciam quando a qualidade da imagem não era tão grande.

Enfim, depois desses 40 minutos, consegui convencer minha mente que aquilo não era um making of. O próximo cenário que ela escolheu pra processar aquilo foi na frente de uma loja de eletrodomésticos, com uma tela particularmente enorme. Não sei se vocês já pararam pra observar como, de relance, as imagens dessas TVs de loja parecem incrivelmente mais detalhadas e bonitas que a que você tem na memória sobre o filme, depois de sair do cinema. De fato, elas são diferentes. Esse post do Stu Maschwitz explica isso em detalhe, e também como DESFAZER esse erro crasso dos fabricantes de TVs. Basicamente, eles aumentam o contraste, pintam tudo de azul, aumentam a clareza (sharpness) e geram novos frames artificialmente, para dar mais “naturalidade” aos movimentos”.

Não sei na cabeça de quem isso dá mais naturalidade. Pra mim só fica mais artificial, e com cara de vídeo. Cara de algo que eu vejo na rua, ou numa fita VHS. Mas eu não vejo hobbits, magos, anões e orcs nas ruas. Então aquilo ali só pode ser falso, e é aí que tudo vai pro brejo, porque quando uma coisa é artificial, mas tenta se passar por real, ela fica tosca. Numa analogia estranha, quando o sujeito é feio, mas age como se fosse bonito, não dá pra não achar engraçado ou ter pena. E nessa hora que a coisa fica tosca, você, espectador, é jogado pra fora do filme mais rápido que uma flecha de Legolas (em 24fps, por favor). Incontáveis vezes eu me perdi num diálogo por estar observando os pelinhos da barba de um orc no contraluz, ou os entalhes confusos do cajado de Gandalf, ou até a reflexão estranha da luz que bate nas pedras da montanha onde a Companhia se protege, na cena da tempestade e da batalha dos gigantes de pedra.

  • Diego Orge Gomes December 27, 2012 at 11:29 am

    Quando assisti o filme em 48, senti uma enorme estranheza. Estranheza que sumiu do meio pro fim na maior parte dos planos. Eu percebi que me acostumei mais com a alta velocidade dos planos gerais em comparação com os mais fechados.

    Quando você falou que o efeito final era de deixar mais irreal, me passou pela cabeça os machados esquisitos e os anões com a maior cara de duendes. Porém acredito que este seja um efeito provisório. Afinal, como foi dito no Omelete, nós passamos a vida inteira assistindo a filmes em 24fps, então é natural que tenhamos uma dificuldade na transição. Acho que precisaríamos ver mais e mais filmes em 48. Os gêneros certos, é claro. Imagina esse efeito num filme paradão de drama!

    Claro que você já sabe disto, mas o nosso olho enxerga analogamente a uma câmera a 60fps e a maioria dos jogos “hardcore” estão nesta taxa – nem por isso sentimos qualquer estranheza.

    Pois então. Concordo que tenha sido estranho, mas acredito que seja algo para nos educar ainda(tanto cineastas, quanto espectadores), como com relação ao próprio 3D, que muita gente não consegue gostar ou se acostumar.

  • Tito Ferradans December 27, 2012 at 2:11 pm

    O 3D eu achei maravilhoso, como poucos. Hugo e Avatar completam a lista. O resto dos 3Ds que vi, não me convenceu e dão dor de cabeça. (animações não contam).

    Então, isso da velocidade do olho eu acho que é muito relativo, porque quando você toma uma bomba de adrenalina e tudo parece acontecer mais devagar, teoricamente você tá vendo trocentos mil frames por segundo.

    Uma coisa que eu também senti foi que parecia muito com um jogo. Jogos são um universo paralelo, e acho que eles tem muito a aprender com o cinema, e vice versa, mas não nos aspectos técnicos. Eu não quero participar do filme. Se eu quisesse, ia ao teatro, não ao cinema. Ou até mesmo jogar, que nem precisa sair de casa. :P

    E aí temos mais um conflito, porque jogos nativamente não tem motion blur. E isso é muito estranho e artificial quando você esquece de habilitar. Aí você vai e clica numa opção do menu, e voilá, motion blur em cada toque do mouse. Mais imersão através disso, porque a gente vê as coisas borradas!

    Só temos ausência de blur – justificada e compreensível – em cenas de muita ação e adrenalina onde o visual tem algo a ganhar com isso – trilhões de partículas voando pelo ar, pedacinhos de carne, gotículas minúsculas de água. Nenhum desses é aproveitado no Hobbit.

    Voltando pra taxa de quadros, um dos planos mais marcantes da trilogia, é um detalhe do anel voando – acho que no segundo filme – e caindo no dedo de Frodo. É um plano super fechado, em câmera lenta com MUITO menos que 24fps. E é dramático. Demais. Olhando com calma, dá pra achar muito mais exemplos em que ter menos quadros por segundo traz um resultado melhor do que ter o padrão de 24, mas sempre adequados à linguagem do filme e à narrativa.

    Mais uma vez, chamo o Sr. Maschwitz em meu socorro. :P

  • Tito Ferradans December 27, 2012 at 2:13 pm

    Ops, link errado no fim do comentário, era esse:
    http://prolost.com/blog/2009/2/24/slumdog-millionaire.html