Day-to-Day

Nome: Desobjeto.

September 3, 2009

O menino que era esquerdo viu no meio do quintal um pente. O pente estava próximo de não ser mais um pente. Estaria mais perto de ser uma folha dentada. Dentada um tanto que já se havia incluído no chão que nem uma pedra um caramujo um sapo. Era alguma coisa nova o pente. O chão teria comido logo um pouco de seus dentes. Camadas de areia e formigas roeram seu organismo. Se é que um pente tem organismo.

O fato é que o pente estava sem costela. Não se poderia mais dizer se aquela coisa fora um pente ou um leque. As cores a chifre de que fora feito o pente deram lugar a um esverdeado musgo. Acho que os bichos do lugar mijavam muito naquele desobjeto. O fato é que o pente perdera sua personalidade. Estava encostado às raízes de uma árvore e não servia mais nem pra pentear macaco. O menino que era esquerdo e tinha cacoete pra poeta, justamente ele enxergara o pente naquele estado terminal. E o menino deu pra imaginar que o pente, naquele estado, já estaria incorporado à natureza como um rio, um osso, um lagarto. Eu acho que as árvores colaboravam na solidão daquele pente.

Manoel De Barros.

  • Tito Ferradans September 3, 2009 at 5:56 pm

    Mainha que me mandou essa. Mereceu ser postada!

  • fatima September 3, 2009 at 11:01 pm

    O Título/nome (as coisas que Manoel de Barros escreve, não têm ‘título’, têm nome, são humanas que nem nós…) desse texto é “Desobjeto” e está no livro “Memórias Inventadas – A Infância”. (O editor pediu que escrevesse suas memórias, ele contrapropôs: só se forem memórias inventadas! O editor topou.

  • fiuzalima September 3, 2009 at 11:15 pm

    Este Blog tá cada dia mais cultura.

  • samy September 4, 2009 at 9:20 am

    concordo com donk! Ta super cultural! To adorando toda essa cultura! Mas eu sempre adoro td mesmo hahahahahaha
    p.s.: to acessando o blog do meu celular \o/