Day-to-Day

UP13 – 3D

June 30, 2014

Dentre todas as vantagens que nossos olhos têm em relação a uma câmera, há uma bem óbvia e indiscutível: nossos olhos são DOIS, enquanto a pobre da câmera tem uma lente só. E veja só, você não percebe as coisas em dobro, apesar dos dois olhos! O cérebro recebe as imagens de ambos e processa tudo como “uma coisa só”.

Como há uma distância entre os olhos, cada um vê o que está na sua frente de forma levemente diferente do outro, apesar de o foco de ambos estar no mesmo ponto. O resultado dessa coisa toda de “dois para um” é que temos uma excelente noção de tridimensionalidade, espaço e distâncias. É fácil dizer, sem se mexer, se um objeto em cima da mesa está ao alcance da mão ou não; ou que objeto está mais próximo e qual está mais distante; é possível ter consciência da distância do carro da frente, no trânsito por exemplo, e a lista de exemplos segue.

Desde tempos remotos – leia-se: 1936 – a humanidade tenta replicar essa noção de espaço tridimensional, mas projetado sobre uma superficie bidimensional, seja uma foto ou uma tela. A técnica tem até um nome bonito: estereoscopia, cuja etimologia é a combinação de “estéreo”, dois, os olhos, e “scopia”, visão. Bem fácil de entender.

O cinema, atualmente é a maior plataforma para ter acesso a esse tipo de fotografia. Mas não se iluda: filmes em 3D são produzidos desde a década de 1950, e têm seus ciclos de altos e baixos, caindo no esquecimento e voltando à vida algum tempo depois. No começo, a estereoscopia era só mais uma forma de diferenciar o cinema da televisão mas, recentemente, cada vez mais, essa característica técnica tem sido utilizada como uma ferramenta narrativa, ajudando a contar uma história de uma forma tal que não poderia ser feita no tradicional 2D, e afastando o rótulo de que 3D é só “muito legal” ou “muito curioso”.

Um requisito mínimo é o uso de dois receptores de imagem: um para cada olho. O método mais simples consiste de duas câmeras presas a uma barra, levemente distantes entre si (sete centímetros é uma boa média), focadas e apontadas para um mesmo assunto. Disparadas simultaneamente, a câmera da direita produzirá uma imagem equivalente ao olho direito, e a câmera da esquerda, o mesmo, pro olho esquerdo. Existem outras formas de captação 3D, mas exigem equipamentos muito específicos e caros, então não entrarei em detalhes.

Depois de produzidas as imagens estereoscópias, certas pessoas conseguem simplesmente colocá-las lado a lado, cruzar os olhos e perceber a tridimensionalidade entre as duas sem a necessidade de apetrechos. A grande maioria de nós, porém, precisa da ajuda dos óculos especiais.

As duas imagens devem ser projetadas – ou impressas – uma por cima da outra e “algo” deve fazer com que cada olho só perceba sua imagem correspondente. É aqui que entram os óculos, filtrando o que cada olho deve ver, e excluindo a imagem relativa ao outro olho. A forma mais simples de fazer isso é através da oposição de cores. Lembra daqueles óculos de papelão, com gelatinas coloridas, onde um olho é vermelho e outro ciano?

Tingindo-se uma das imagens totalmente de ciano e a outra totalmente de vermelho, basta por os óculos no rosto e, devido à coloração das “lentes”, cada olho só percebe a imagem que lhe é designada. Voilá! Você está vendo 3D, numa superfície 2D! O maior defeito desse método é que você perde as cores originais da cena, resultando numa imagem em preto e branco.

A outra opção – que mantém as cores da fotografia – comum em cinemas, é através da polarização da luz.. As lente dos óculos são polarizadas em 45 graus, uma delas no sentido horário, a outra no sentido anti-horário, assim como a projeção do filme, que sobrepõe as imagens polarizadas. Dessa forma, um olho só vê o que foi polarizado no sentido horário, e o outro só vê o que está no sentido anti-horário. O mais curioso dessa alternativa é que se você tirar os óculos, grande parte da projeção não terá nenhum foco! Tem uma matéria recente – e hilária – sobre um camarada que assistiu o Wolverine em 3D, mas sem os óculos e não conseguiu enxergar – ou entender – quase nada do filme.

Estereoscopia é uma das coisas mais complicadas que já apareceram aqui na coluna, e, por ser um campo bastante incomum, é preciso experimentar MUITO antes de se chegar a qualquer resultado realmente impressionante. Mas a apresentação já está feita e está aberta a porta. Fica o desafio de utilizar a tridimensionalidade não apenas como efeito, e sim como ferramenta para contar sua história de forma única.


Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #27, em Novembro/2013