Anamorphic Day-to-Day

[Anamórficos II] Fim da Historinha, Dióptros, Flares e Coating.

September 7, 2012

O que o ócio não faz com as pessoas? Cá estou eu de novo pra terminar essa história, já que não tenho nada mais útil pra fazer.

Então estamos em 2009, e todas essas coisas estranhas que eu falei antes podem ser encontradas no eBay por preços ridiculamente baixos. A 5D saiu no ano anterior e já estava revolucionando o mercado de vídeo, e então, não descobri ainda como, nem por quê, alguém resolveu testar essas lentes pitorescas, antiquadas e, no momento, baratas, em combinação com uma DSLR. Não vou arriscar dizer que foi com uma 5D, mas há grandes chances. Também há grandes chances de ter sido com uma Panasonic GH1 ou GH2.

Então, esse cidadão curioso viu que sua idéia estranha formava imagem, e viu mais: essa imagem era sensacionalmente comprida. E em algum fórum – provavelmente no DVXUser – ele postou os resultados dos testes, e mais algumas pessoas ficaram curiosas. Dentre essas, posso citar Andrew Reid – do EOSHD -, Edwin Lee – famoso por ser um dos pioneiros – e um sujeito que atende por Redstan – que era engenheiro e facilmente dominou a técnica por trás dessas lentes. A partir de seus próprios testes e impressões, publicados no vimeo, no próprio EOSHD e nos fóruns, começou o rush pelas anamórficas no exterior. Em menos de um ano, os Iscoramas que saíam por US$200, agora chegavam a US$4000 nos leilões, e outras coisas ganhavam valores absurdos.

Vendo essa ascenção de preços, muitos donos de lentes anamórficas sem uso resolveram vendê-las, aumentando a oferta, e portanto diminuindo os preços. Agora, três anos depois do surto, um Iscorama atinge facilmente a marca dos US$2000, mas não vai muito além disso. O Isco36 virou uma espécie de diamante precioso, por seu tamanho, peso e qualidade óptica, então, ignora essa “regra” dos US$2000, e ainda atinge valores mais altos quando aparece.

LOMOs variam muito de preço, pois muitas delas já têm padrão de lentes de cinema, portanto ultrapassam os US$4000, mas nunca custaram barato mesmo, e foram incorporadas ao mercado DSLR a partir do uso de adaptadores. O Panasonic LA7200 gira entre US$1000 e US$1500, e as demais lentes – Kowa, Hypergonar, Sankor – perto dos US$300 a US$400.

À exceção das LOMOs e dos Iscoramas de um bloco, todas as anamórficas podem ser consideradas como “adaptadores” somados à lente base. Eles são uma coisa que você põe na frente dessa lente, e obtém o resultado espremido, tipo um filtro, só que mais hardcore. Logo que comecei as pesquisas, vi que para trabalhar com segurança, é preciso usar Clamps para prender as duas lentes. Clamps são grandes anéis de metal, que encaixam no fundo da lente anamórfica, são fixados com parafusos, e terminam numa rosca de filtro, que você encaixa na frente da lente base. Isso garante a maior proximidade possível entre os dois dispositivos, portanto, menor perda de luz. Dos vários desafios encontrados em usar lentes anamórficas, a perda de luz é desprezível, menor que 1/3 de stop.


Redstan Clamp for Kowa Bell & Howell, 62mm

Muitas lentes anamórficas já têm roscas em seu elemento traseiro, mas como são muito antigas – pré 1970 – esses tamanhos não são padronizados, e temos muitas medidas quebradas, como 83mm, ou 73mm. Portanto, as Clamps servem para consertar esse problema. Elas também servem para garantir o alinhamento do elemento anamórfico. Você pode soltar os parafusos sem que a lente caia e corrigir o alinhamento, para que o squeeze atue na direção correta. A coisa mais fácil do mundo é você terminar de rosquear a anamórfica na frente da lente base, e a imagem estar totalmente torta no visor. Os exemplos abaixo ilustram bem isso tudo.


Imagem desalinhada esticada (ampliável), imagem alinhada esticada (ampliável), imagem alinhada não esticada, respectivamente.

Aquele Redstan que eu falei antes, é famoso por suas Clamps, especialmente projetadas para cada modelo das anamórfica mais populares. Tenho duas dele, e uma de outro fabricante (Vid-Atlantic), e devo admitir a superioridade da Redstan em todos os aspectos. Para melhor trabalhar com anamórficas, é necessário o uso constante de filtros close-up – explico mais adiante! – e portanto, muitas lentes também precisam de adaptação no elemento frontal, para rosquear os filtros, são as Front Clamps.


Redstan Front Clamp for Kowa Bell & Howell, 72mm

Nessa brincadeira de filtros, roscas, encaixes e etc, comprei trocentos anéis adaptadores no eBay, vindos direto da China/Hong Kong. Aqui, cada um deles chega a custar R$40, lá, saem por menos de US$2, e você encontra (quase) todas as conversões que imaginar. A maioria das minhas lentes aceita filtros de 72mm e 77mm. Só o LA7200 e o imenso Isco54 tem um encaixe traseiro tão grande, portanto, precisei de anéis para adaptar as minhas lentes para tamanhos menores como 52mm e 62mm. O mesmo vale para os filtros que vão ficar na frente das anamórficas. Saí procurando os mais adequados para cada caso, e elaborando jeitos de adaptá-los em cada lente – mais detalhes adiante.


Kowa Bell & Howell + Redstan Clamps – squeeze 2x

É sempre bom lembrar que estamos falando de lentes bem velhas aqui, e nem sempre em bom estado de conservação. É preciso estar atento antes de comprar qualquer coisa para não receber uma lente riscada, ou cheia de fungos. Aproveitando a deixa da idade das meninas, a grande maioria delas foi fabricada antes do desenvolvimento do multi-coating (MC), essa camada de reflexos coloridos que protege nossas lentes modernas de flares, riscos, garante melhor definição e maior rendimento luminoso – que apareceu no mercado em meados de 1970. Elas têm uma tendência de serem single-coated – produzidas a partir de 1950 -, que é uma característica decisiva num dos maiores fetiches anamórficos dos tempos atuais: flares.

“E qual a diferença? Flare é sempre ruim!”. Será? Nosso amigo J.J. Abrams discorda, e gosta tanto de flares anamórficos que, no Star Trek, tinha sempre uma pessoa fora de quadro, apontando uma lanterna para dentro das lentes, com o único objetivo de gerar flares. Flares anamórficos são compridos, e (geralmente) azuis. E diferentes do que a gente tá acostumado a chamar de flare – que não passa de um borrão na imagem. Essas coisas têm personalidade.


Flares do LA7200

Mas o que acontece se a minha lente base for multi-coated? Bom, muita dessa graça dos flares acaba perdida. Foi pensando nesse caso que trouxe também algumas lentes M42, russas (qualidade alta e preço baixo parecem ser uma constante com itens usados vindos de lá), single-coated, e adaptadas para Canon EF. São elas uma Helios 44-2 58mm f/2 (o AK-47 das lentes, produzido em imensas quantidades, a preços ridículos e altamente confiável), uma Jupiter 9 85mm f/2, Tair 11 135mm f/2.8, Mir 1B 37mm f/2.8 e uma Orestegor 200mm f/4. Todas elas já testadas e completamente funcionais na 5D3. É interessante porque a iris dessas belezinhas não é “clicada”, e você pode alterar enquanto grava, sem parar nos stops certinhos, como muitas lentes manuais atuais (que não sejam de cinema!). E não gastei nem R$800 nelas todas.


Jogo de M42 russas e adaptador.

Com essas lentes base mais velhas combinadas com as anamórficas, o vídeo muda completamente de cara. Elas também ajudam porque os anéis de filtro são consideravelmente menores (49mm a 58mm), portanto, mais fáceis de encaixar. Existem outras opções de mount, além da M42, que podem ser adaptadas para Canon EF. Pentax, Olympus OM, Nikon F, e até mesmo PL. É só uma questão de achar o adaptador certo no eBay. Tudo isso é possível porque a distância da flange (grosseiramente, distância entre o mount e o sensor) de todos esses encaixes é MAIOR que no encaixe EF. Quando essa distância é menor, o bicho pega, e a lente é inadaptável.

Tô com uma dessas por aqui também. É uma LOMO OCT-18, base da LOMO anamórfica. Nesses casos, a saída é usar uma câmera sem espelho – como a Sony NEX, ou a Panasonic GH2 – porque elas permitem obter qualquer distância entre o encaixe e o sensor. Eu ainda não desisti dessa, e marquei uma conversa com o Scavone pra ele dar uma olhada, e quem sabe, arrumar uma solução óptica!

Depois de todo esse devaneio sobre lentes base – recomendo bastante experimentações nessa direção – voltamos ao assunto principal, que já foi mencionado antes e ficou para ser explicado “depois”. Bem, agora é “depois”. Por que lentes anamórficas precisam de filtros?

Ok, omiti parte da informação. “Por que lentes anamórficas precisam de filtros close-up (ou dioptros) para seu bom funcionamento?”. Não sei. Ainda não consegui uma resposta, mas é fato que precisam. Na grande maioria das lentes, o foco mínimo é de 2m. Em alguns casos, 1.5m, e convenhamos, 1.5m é uma distância bem grande para fazer um plano próximo decente, usando uma lente que abre sua distância focal (com um squeeze de 2x, uma 85mm vira algo perto de 40mm no eixo horizontal). Além disso, quando você usa aberturas muito grandes (qualquer coisa mais aberta que f/4), há grande chance de o foco se tornar um desafio à parte.


Canon T2i + Helios 44-2 58mm f/2 + Kowa Bell & Howell, em seu foco mínimo, com a íris toda aberta (ampliável)

Então vamos todos nos teletransportar para as aulas de Imagem III, onde o Scavone explica o que é um filtro close-up. Um close-up é a mesma coisa que um óculos de leitura. Ele faz com que o “infinito” da lente, seja aproximado. A distância dessa aproximação é dada pelo inverso de sua força. Um filtro +1 traz o infinito a 1m de distância, um filtro +2 traz o infinito a meio metro, e assim por diante, e, com isso, eles também aumentam a imagem. Tem uma continha por trás disso tudo, mas eu não vou entrar no assunto.

Com isso, perdemos o foco no infinito original das lentes, mas temos a possibilidade de fazer planos próximos e detalhes com foco, e grandes aberturas. Se você ainda tinha alguma esperança de fazer um super-plano-sequência-muito-louco-anamórfico, é melhor desistir. No meu caso, achei que a melhor saída seriam filtros Serie 9, um padrão antigo, onde os filtros medem mais ou menos 86mm, não tem rosca mas são colocados em um adaptador, que por sua vez, encaixa no bocal da lente. Esse adaptador tem vários tamanhos de anel (no meu caso, 72mm, 77mm e 86mm), que são suficientes para encaixar e funcionar com todas as lentes atuais, e me poupa o trabalho – e despesa – de ter um conjunto de filtros diferente para cada anamórfica. Tenho aqui então três close-ups. +0.3, +0.5 e +1. Futuramente considero arrumar um +2, mas preciso me recapitalizar primeiro.


Canon T2i + Helios 44-2 58mm f/2 + Kowa Bell & Howell + Series 9 Close Up +1, em seu foco mínimo, com a íris toda aberta (ampliável)

Queria colocar mais coisas nesse post, mas o título já tava imenso, e vou deixar pro próximo. Além disso, tô caindo de sono, e fiz três posts imensos num dia só, batendo fácil todos os outros posts de 2012. Em breve, uma análise mais cuidadosa de cada uma das lentes que tenho por aqui, e algumas teorias sobre as que não tenho. Tô pensando em fazer também um guia de compras, com detalhes mais técnicos de cada lente, pro caso de alguém querer embarcar na jornada. Ainda falta falar sobre a pós-produção, mais detalhes sobre os focus-through, que tipo de lentes evitar, e testes mais precisos envolvendo flares, foco mínimo e definição em grandes aberturas e lentes variadas. Vou tentar fazer um vídeo-tutorial do processo de “encaixar todas as peças”, porque isso também facilita muito a compreensão das coisas. Pronto, chega. É assunto mais que suficiente pros próximos posts.

  • Felipe Albanit September 7, 2012 at 2:11 am

    Pensando em vender minha casa e gastar tudo em anamórficas. Quando a mansão Tito de lentes legais estiver aberta para exposições, let me know.