Day-to-Day

Besouro.

April 21, 2010

Resenha de Obra Audiovisual Contemporânea.

Fiquei admirado ao assistir pela primeira vez o trailer de Besouro. Origem baiana, somada com grande apreço por filmes de ação e um pouco de esperança em relação ao cinema nacional ajudaram a construir uma grande espectativa ao redor desse filme. Ainda sobre o trailer, as tomadas aéreas – subjetivas, como veremos no longa metragem -, a fotografia impecável, a reconstituição fiel e a promessa de lutas espetaculares, coreografadas por Huen Chiu Ku (O Tigre e o Dragão, Kill Bill, entre outros) justificam tal espectativa.

Sendo bem direto, o resultado final não foi à altura do esperado. A proposta era excelente, abordava um tema novo, de uma forma diferente, sem cair no clichê ou no preconceito. O filme começa com um letreiro narrado, coisa que mais parece uma aula de ensino médio do que um ponto de partida para a vida do maior capoeirista da história desse país. Ambienta o espectador, sim, mas não é a melhor abordagem para esse tipo de filme (ação). Somos então apresentados a Mestre Alípio, ponto de partida da trama, e em seguida vemos Besouro, jogando capoeira quando deveria estar protegendo o Mestre.

O Mestre é baleado e Besouro o leva, moribundo, para a antiga senzala, onde ele profetiza a transformação de seu aprendiz, a personificação da esperança. Besouro seria a materialização de toda a luta dos escravos recém-libertos contra a elite açucareira, representada pela figura do Coronel, e reforçada por Noca de Antônia, seu braço direito.

Daqui para frente, na trama, vemos mais e mais o desenvolvimento dos personagens secundários do que a transformação e bênção de Besouro. Desenrola-se a corrupção de Quero-Quero e o fim de seu romance com Dinorá, que por sua vez se envolve com Besouro, enquanto o mesmo se esconde no antigo depósito, vemos a marginalização dos negros capoeiristas e a brutalidade dos capangas do Coronel na cena da sétima noite após a morte de Mestre Alípio, em que há uma roda de capoeira e vários lutadores, onde Noca chega, dispersa todos violentamente e quebra as pernas de Chico Canoa.

No outro campo da história vemos o encontro de Besouro com os orixás, com uma mãe de santo (Zulmira), que o abençoa, fechando seu corpo contra balas e outros ferimentos, e sua mudança de atitude, saindo das sombras para atacar os inimigos de seu povo. Ele sabota um engenho, mata capangas do Coronel, encoraja os negros a saírem de seus esconderijos e lutarem pelos seus direitos, além de colocar medo em Noca de Antônia, que o considera “capaz de voar”.

Outro ponto incômodo é que todos os atores (à exceção de Irandhir Santos, que interpreta Noca de Antônia) têm sotaque paulistano, sendo a história ambientada no recôncavo baiano, na década de 1920. Poderia até entrar aqui a questão da compreensão do público em relação ao que os personagens estão dizendo, mas o sotaque “de fora” é muito forte, sem nem mesmo um pouquinho do sotaque local, que é acentuado no interior. Na verdade, toda a atuação do filme varia entre razoável e ruim, à exceção, novamente, de Irandhir Santos. Quando seu personagem morre, dá desespero só de pensar que ainda falta cerca de meia hora sem um ator bom sequer na tela.

Em termos de técnica e estética, não há problemas. O som não apresenta defeitos, a trilha foi muito bem selecionada, a fotografia é uma maravilha – tanto nas externas como nas internas -, e todos os planos são bem articulados, apesar de um tanto previsíveis. Temos boas representações das florestas, lagos e águas correntes do interior da Bahia, belíssimas representações dos orixás e da cultura do candomblé, além de todas as lutas serem de tirar o fôlego (Dee Dee faz seu trabalho com maestria).

Atenção especial para todas as tomadas subjetivas de Besouro ou do sapo, em que vemos uma liberdade de câmera “à lá Edgar Brasil” . O grande defeito do filme basicamente se apresenta nas atuações e no desenvolvimento da trama, ah, e nem se pode levar em consideração os efeitos digitais, como o besouro que aparece logo no começo, voando de um lado pro outro, mais falso que qualquer um dos atores. No fim, mais um letreiro narrado, que praticamente encerra a “aula” iniciada 90 minutos atrás.

  • Diego Orge April 25, 2010 at 10:26 pm

    Hahahah. Agreed. O trailer do filme havia empolgado muito a nós todos. Antes de assistir ao filme ainda ouvi pessoas a dizer que o filme era muito ruim e eu não conseguia acreditar. Quando vi, no cinema, fiquei muito desapontado. Muito mesmo. Concordo com o que diz a respeito do – novamente – maldito resultado.

  • Tainan April 29, 2010 at 12:28 am

    e eu fui mais um ludribriado pelo trailer, outro detalhe que eu notei foi o uso incansável do termo “rapaz” que é cosas da atualidade bahiana e não dos tempos pós-escrevidão recente que se ainda usava vos mi cê e sinhá!

  • felipe May 6, 2010 at 11:07 am

    sério que tu esperava alguma coisa? me cheirou a bomba desde o primeiro trailer.