Hoje ficamos desenhando bolinhas indo de um lado para o outro. Como não tem nada mais hipnótico que um loop, cheguei em casa e fiz esse no Photoshop, porque tava muito inspirado!
O ano vai chegando ao fim, e temos mais uma parte de “O Hobbit” entrando em cartaz nos cinemas. Assim como no ano passado, o filme chega com uma grande variedade de versões, mas a discussão aqui vai focar-se na mais diferente de todas: a tal da HFR (high-frame-rate). Alardeada pela produção do filme como uma grande revolução no cinema, a versão HFR tem o dobro de quadros por segundo que um filme normal.
O padrão cinematográfico, estabelecido ao longo de mais de cem anos de história, é de 24 quadros por segundo. Na TV são 30 quadros por segundo. Alguém muito importante na equipe de “O Hobbit” afirmou que 48 quadros por segundo seriam uma coisa fantástica pelos seguintes motivos: há mais foco, menos borrão de movimento, mais sensação de realidade e mais imersão no filme. Desses quatro motivos, três são plausíveis, mas o último é extremamente falso.
Durante a primeira metade do filme, a sensação é de assistir a um making of onde os equipamentos estavam escondidos e tudo se move de forma acelerada. Todas as ações parecem acontecer mais rápidas do que de fato ocorrem. Realmente, os detalhes aparecem muito mais em foco, e são tantos detalhes perceptíveis que até prejudicam o filme. É possível desconfiar dos objetos de cena, que parecem falsos (feitos de isopor e compensado), os mesmos objetos que são perfeitamente convincentes na versão tradicional (a 24 quadros por segundo) do mesmo filme!
Depois da primeira metade da projeção, consegui convencer minha mente que aquilo não era um making of. O próximo cenário escolhido pra processar as imagens foi na frente de uma loja de eletrodomésticos, com uma tela particularmente grande. Não sei se vocês já pararam pra observar como, de relance, as imagens dessas TVs de loja parecem incrivelmente mais detalhadas e bonitas que as do cinema, ou das nossas TVs de casa. De fato, as imagens daquelas TVs são bastante diferentes das originais, por conta de uma série de configurações especiais, aplicadas pelos fabricantes, para passar justamente essa sensação de “realidade”. Basicamente, o que se faz é aumentar o contraste, jogar uma tonalidade azulada na imagem como um todo, aplicar um filtro de nitidez e sintetizar novos frames (inexistentes no filme original), para dar mais “realidade” aos movimentos, a uma taxa de quadros mais elevada que os 24 ou 30 quadros originais.
O resultado é extremamente exagerado e tem uma textura de vídeo, como o jornal que vemos na hora do almoço, ou jantar. Não é mais ficção, é realidade. Fica com cara de algo que pode ser visto acontecendo na rua. Mas (infelizmente) não temos hobbits, magos, anões e orcs perambulando pelas ruas. Então aquela imagem projetada ali só pode ser falsa, e é aí que a imersão vai para o brejo, porque quando a coisa é visivelmente artificial, mas tenta convencer como real, tudo fica tosco. Numa analogia estranha, quando o sujeito é feio, mas age como se fosse bonito, não dá pra não achar engraçado ou ter pena. E nessa hora que a coisa fica tosca, nós, espectadores, somos jogados para fora do filme mais rápido que uma flecha de Legolas (a 24 quadros por segundo, por favor).
Em 2009, o filme “Quem Quer Ser Um Milionário” ganhava o Oscar de Melhor Direção De Fotografia. A parte curiosa é que todos os trechos do filme que evocam sentimentos e emoções intensas foram filmados a menos que 24 quadros por segundo (para ser exato, foram filmados a 12 quadros por segundo). É um visual ainda menos fluído que o tradicional, mas funciona justamente porque caminha em uma direção onírica, oposta à realidade. Quanto mais quadros por segundo mais nos aproximamos da realidade em que vivemos. Só que ninguém vai ao cinema para ver a realidade. A gente vai no cinema justamente pra ter uma folga da realidade, e acompanhar uma história bem contada, com personagens fantásticos.
Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #28, em Dezembro/2013
Uma semana de aula, com um feriado no meio (dia primeiro foi Canada Day), e só agora tive tempo pra contar historinhas, começando pela mudança, do apartamento do Wyll para o meu próprio!
Era pra ter sido no domingo (passado), mas não tinha ninguém da administração do prédio por aqui, então ficou pra segunda feira. Por sorte não tive a última aula, e deu pra voltar pra casa perto de 2:30pm. No domingo eu rodei o mundo inteiro pra providenciar as coisas que faltavam (roupa de cama, toalhas, pano de prato, papel higiênico, produtos de limpeza, uma poltrona, e TUDO mais que vocês imaginarem). Foi só aí que percebi que montar uma casa é FODA! E toda hora você descobre que tá faltando alguma coisa fundamental!
Eu e May queríamos uma poltrona colorida pra dar vida na casa, e então fomos procurar no site mais útil quando novo em Vancouver: craigslist. Tem TUDO. Coisas de segunda mão, coisas novas, muita coisa de graça – é só passar e pegar! E foi lá que achamos uma poltrona bonita. Nova, custava $180. Essa tava por $50. Falei com o pessoal que tava se desfazendo dela (estavam se mudando para Alberta), e combinei um horário (no mesmo domingo!) para resgatá-la. Precisava providenciar uma bike também, então saí com duas horas de antecedência, para passar em várias lojas de bicicletas novas, usadas, caras e baratas.
Assim que saí do metrô, tava começando a chover. A cadeira e UMA loja eram na direção oeste, e SEIS lojas de bike eram pra leste. Pensei em começar primeiro rumo leste, achar uma bike boa no processo e acelerar a volta me deslocando sobre duas rodas. ÓBVIO que não achei uma bike decente nessa lojas, né? Andei de loja em loja, e nenhuma tinha nada interessante. Algumas tinham bikes boas, mas caras, outras tinham bons preços, mas bikes muito pequenas pra mim. Resultado, tive que andar quase cinco quilômetros da loja mais extrema a leste até o loja do lado oeste. Se quando eu saí do metrô tava choviscando, agora já tava um toró desgraçado, e como eu tava com horário marcado com o povo da poltrona, não dava pra esperar a chuva passar. Depois de cinquenta minutos empenhado nessa volta, caminhei tanto que cheguei no fim da nuvem de chuva. E aí era Sol. Muito Sol.
Cheguei na última loja de bicicletas – que era a mais perto de casa, e por isso deixei por último, e também perto de onde eu ia pegar a poltrona – e lá estava ela, me esperando. Paguei menos da metade do preço de uma nova ($150, quando as novas custam quase sempre muito mais de $300). Fui de bike da loja até o pessoal da poltrona, e de lá peguei um táxi pra deixar tudo em casa. Na portaria do prédio encontrei coleguinhas de sound design, que estavam indo comprar tupperwares. Vancouver é uma cidade é pequena! Desde que comprei a bike, estou andando muito com ela pela cidade. Estar no trânsito é que me fez perceber como as ruas são vazias de carros. É muito tranquilo, e seguro, andar de bicicleta em Vancouver. Fiz o trajeto casa-escola em 10 minutos. A pé, levo meia hora. Durante a semana, só andei com ela. Ontem saí pra almoçar aqui perto e só então percebi que não passava pelo Lobby há sete dias.
No Sábado (passado) eu já tinha ido aqui na esquina de casa, pegar um colchão de casal, DE GRAÇA, de um casal de irlandeses que estava voltando pra sua terra natal, depois de 2 anos e meio no Canadá. COLCHÃO DE GRAÇA! E excelente, em termos de qualidade, conforto e conservação! O Wyll tem um box pra colocar embaixo dele, e deixar com cara de cama, mas, por enquanto, é só um colchão no canto da casa mesmo.
Nessa jornada de compras e missões de Domingo eu andei 17.5km a pé (como referido no post anterior!). Imagina como minhas pernas não tavam adorando isso no fim do dia. Deitei e morri, pra acordar quarenta minutos antes do despertador, na segunda, para o primeiro dia de aula.
Continuando de segunda feira, depois da aula. Cheguei no apartamento e a reforma tinha trocado o piso, de carpete pra madeira (YEEEAAH!!), repintado tudo, turbinado uns armários, trocado tudo no banheiro, cortinas da sala/quarto, e tudo mais. Claro, tava tudo cheio de sobras de obra, poeira pra todo lado, uns armários ainda tinham sujeira do dono anterior, a louça toda eu tinha pego de graça com um casal de brasileiros que tava voltando pro Brasil, então também precisava lavar.
Peguei uma vassoura emprestada com o Wyll e comecei a brincadeira. Fui de três da tarde a dez da noite até terminar de arrumar tudo, colocar as coisas nos armários, esvaziar a mala, guardar comidas, limpar o banheiro, tirar umas coisas perdidas do fundo dos armários, comer três vezes durante o processo, sair pra comprar detergente (de bike, claro!), porque não tinha ainda, carregar móveis prum lado, carregar móveis pro outro, varrer a casa toda de novo, levar o lixo pra garagem, levar mais lixo pra garagem, levar MAIS lixo pra garagem – numa dessas idas, achei duas almofadas da cor do piso, que já carreguei pra casa -, devolver as coisas do Wyll e, afinal, dormir, totalmente exausto, mas muito feliz por estar na minha casinha, em ordem, e ainda sem internet.
Vivi sem internet em casa de segunda até sexta, quando o técnico da Shaw veio aqui e instalou tudo. Eu tava na escola, então deixei uma chave com o Wyll e ele me fez a gentileza de acompanhar o técnico durante a instalação. Agora já estou internetado, e tudo é muito mais fácil, especialmente escrever nesse blog!
Apartamento, uma sala vazia sem mesa, mas com bike!
Agora, a parte interessante: a VFS é sensacional. É tipo a estrutura do CTR, com mais bom gosto e MUITO mais dinheiro. O prédio onde tenho aulas é um grande corredor circular, com salas de aula concentradas no centro e nas laterais. Tem mais uns quatro ou cinco prédios pra outros cursos, mas não tive a chance de conhecê-los ainda. A turma tem 28 pessoas, só dois canadenses, e só UM de Vancouver. Graças à última semana eu já conhecia muitos dos meus coleguinhas, porque fizemos várias coisas pela cidade, então a integração já tá meio caminho andado. Eles recomendam muito que a gente se una e forme um time, porque isso afeta bastante a performance geral da turma.
O ritmo é bem puxado. Conhecemos os supervisors do curso, e de cada área de especialização (Animation, Modeling e VFX). Todos muito gente boa, e com muita experiência de mercado. Conhecemos também a administradora geral do curso, e vimos muitos demo-reels (que são vídeos mostrando coisas feitas pelos alunos). Num dia normal, a gente tem três aulas de três horas. Começando às 9am, intervalo de uma hora para almoço ao meio dia, e retorno de aulas à 1pm. A última aula começa às 4pm. Nessa primeira semana tivemos aulas teóricas e práticas, mas tudo muito interessante e bem planejado. A escola é bem séria, não pode faltar mais do que 3 aulas a cada term (2 meses), e a média tem que ficar sempre acima de 65% pra passar, senão eles consideram que você não tá absorvendo o conteúdo, e tem que repetir a matéria, como dependência (enquanto cursa o term seguinte ao mesmo tempo). Por enquanto tô tranquilo, mas sei que logo mais vão começar a chover tarefas.
Temos duas aulas de História dos Efeitos Visuais e Animação por semana, e essas têm forte semelhança com as aulas de História do Audiovisual, na USP. Só que o professor é um brincalhão, que fica mostrando as coisas mais pitorescas antes e depois da aula, tanto que a galera fica assistindo, mesmo depois que acaba. Semana passada a gente viu um reel (em um projetor 16mm) daquelas homenagens feitas na cerimônia do Oscar, de 1986. Como a aula acabou bem depois do horário, deixamos um curta de Chaplin para uma futura ocasião. A segunda aula ele abriu com várias aberturas de cinemas da década de 1950 (sabe aquelas coisinhas de “seguro allianz” e similares? Era beeeem diferente, e hilário. Fechou então com “Dumb Ways to Die”, e ainda cantou junto com o vídeo, encorajando uma galera a cantar também. Surreal e maravilhosamente upbeat.
Durante as aulas, vimos MUITA coisa foda sobre a Disney, as inovações que eles trouxeram, assim como os irmãos Fleischer (criadores de Popeye, Betty Boop e outros), inventores que nas décadas de 1920 e 1930 projetaram e aplicaram conceitos que continuam sendo usados até hoje, em todas as produções e softwares. Essas aulas, combinadas com o que vemos nas outras matérias, realmente fortalecem nosso background, porque a gente passa a entender COMO aquela função específica foi criada, como funcionaria (no mundo real, fora do computador) e REALMENTE abre os olhos para como as animações do passado eram incrivelmente absurdas de se desenhar (um ser humano ficava assistindo água cair nas folhas, por horas, tomando notas e rabiscando coisas, pra poder replicar a realidade nas animações, por exemplo! O mesmo vale pra fogo, vento, lava, coisas quebrando, anatomia e o escambau).
Tivemos uma introdução muito hardcore ao Maya (programa de modelagem, animação e o caralho, em 3D), e tô estudando um bocado por conta própria, pra não ficar pra trás. Depois que você começa a entender o que tá acontecendo na tela, até que tudo parece fazer sentido. Ele só não é muito amigável com desconhecidos. Tivemos também uma aula envolvendo os controles de animação do programa, durante a qual tivemos que fazer um exercício ao mesmo tempo que rolava o jogo do Brasil vs Colômbia. Mais da metade da sala tava assistindo a partida em seus monitores secundários, e o clima tava tenso porque temos três colombianas e dois brasileiros na turma. Felizmente, levamos a melhor.
Bom, chega de escrever. Vou voltar aqui pro Maya, que há muito a estudar!
Dentre todas as vantagens que nossos olhos têm em relação a uma câmera, há uma bem óbvia e indiscutível: nossos olhos são DOIS, enquanto a pobre da câmera tem uma lente só. E veja só, você não percebe as coisas em dobro, apesar dos dois olhos! O cérebro recebe as imagens de ambos e processa tudo como “uma coisa só”.
Como há uma distância entre os olhos, cada um vê o que está na sua frente de forma levemente diferente do outro, apesar de o foco de ambos estar no mesmo ponto. O resultado dessa coisa toda de “dois para um” é que temos uma excelente noção de tridimensionalidade, espaço e distâncias. É fácil dizer, sem se mexer, se um objeto em cima da mesa está ao alcance da mão ou não; ou que objeto está mais próximo e qual está mais distante; é possível ter consciência da distância do carro da frente, no trânsito por exemplo, e a lista de exemplos segue.
Desde tempos remotos – leia-se: 1936 – a humanidade tenta replicar essa noção de espaço tridimensional, mas projetado sobre uma superficie bidimensional, seja uma foto ou uma tela. A técnica tem até um nome bonito: estereoscopia, cuja etimologia é a combinação de “estéreo”, dois, os olhos, e “scopia”, visão. Bem fácil de entender.
O cinema, atualmente é a maior plataforma para ter acesso a esse tipo de fotografia. Mas não se iluda: filmes em 3D são produzidos desde a década de 1950, e têm seus ciclos de altos e baixos, caindo no esquecimento e voltando à vida algum tempo depois. No começo, a estereoscopia era só mais uma forma de diferenciar o cinema da televisão mas, recentemente, cada vez mais, essa característica técnica tem sido utilizada como uma ferramenta narrativa, ajudando a contar uma história de uma forma tal que não poderia ser feita no tradicional 2D, e afastando o rótulo de que 3D é só “muito legal” ou “muito curioso”.
Um requisito mínimo é o uso de dois receptores de imagem: um para cada olho. O método mais simples consiste de duas câmeras presas a uma barra, levemente distantes entre si (sete centímetros é uma boa média), focadas e apontadas para um mesmo assunto. Disparadas simultaneamente, a câmera da direita produzirá uma imagem equivalente ao olho direito, e a câmera da esquerda, o mesmo, pro olho esquerdo. Existem outras formas de captação 3D, mas exigem equipamentos muito específicos e caros, então não entrarei em detalhes.
Depois de produzidas as imagens estereoscópias, certas pessoas conseguem simplesmente colocá-las lado a lado, cruzar os olhos e perceber a tridimensionalidade entre as duas sem a necessidade de apetrechos. A grande maioria de nós, porém, precisa da ajuda dos óculos especiais.
As duas imagens devem ser projetadas – ou impressas – uma por cima da outra e “algo” deve fazer com que cada olho só perceba sua imagem correspondente. É aqui que entram os óculos, filtrando o que cada olho deve ver, e excluindo a imagem relativa ao outro olho. A forma mais simples de fazer isso é através da oposição de cores. Lembra daqueles óculos de papelão, com gelatinas coloridas, onde um olho é vermelho e outro ciano?
Tingindo-se uma das imagens totalmente de ciano e a outra totalmente de vermelho, basta por os óculos no rosto e, devido à coloração das “lentes”, cada olho só percebe a imagem que lhe é designada. Voilá! Você está vendo 3D, numa superfície 2D! O maior defeito desse método é que você perde as cores originais da cena, resultando numa imagem em preto e branco.
A outra opção – que mantém as cores da fotografia – comum em cinemas, é através da polarização da luz.. As lente dos óculos são polarizadas em 45 graus, uma delas no sentido horário, a outra no sentido anti-horário, assim como a projeção do filme, que sobrepõe as imagens polarizadas. Dessa forma, um olho só vê o que foi polarizado no sentido horário, e o outro só vê o que está no sentido anti-horário. O mais curioso dessa alternativa é que se você tirar os óculos, grande parte da projeção não terá nenhum foco! Tem uma matéria recente – e hilária – sobre um camarada que assistiu o Wolverine em 3D, mas sem os óculos e não conseguiu enxergar – ou entender – quase nada do filme.
Estereoscopia é uma das coisas mais complicadas que já apareceram aqui na coluna, e, por ser um campo bastante incomum, é preciso experimentar MUITO antes de se chegar a qualquer resultado realmente impressionante. Mas a apresentação já está feita e está aberta a porta. Fica o desafio de utilizar a tridimensionalidade não apenas como efeito, e sim como ferramenta para contar sua história de forma única.
Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #27, em Novembro/2013
Hoje eu andei 17.5 quilômetros a pé, mais uns tantos de metrô, uns outros de táxi e vários de barco. Foi um dia muito produtivo, com nenhuma cara de Domingo. Aulas começam amanhã, novidades mais palpáveis em breve.
Vi o filme já tem umas duas semanas, e queria escrever sobre como ele parece um jogo – ainda vou entrar nesse assunto -, mas nos últimos dois dias, conheci um bróder da VFS que mudou minha visão sobre jogos de forma tão radical, que esse post pode acabar ficando um pouco confuso. Por exemplo, eu sempre pensei que dizer que um jogo parece um filme, isso era um grande elogio, afinal, filmes são incríveis, certo?
Bom, mas, sendo assim, isso não derruba o propósito de ser um jogo, de ter interatividade, e escolhas, e que essas escolhas afetem o resultado final? Num filme também há escolhas, mas quando você assiste o filme pela segunda vez, as escolhas não mudam! Enquanto que, jogando pela segunda vez, você pode resolver explorar outras possibilidades, diferentes daquela que seguiu na primeira vez. Fez sentido? Se o roteiro de um jogo é MUITO bem definido, isso não é algo incrível, e sim um ponto negativo, uma vez que seu único objetivo ali é chegar ao fim da história, e fim do jogo também. Não importam as escolhas feitas, o final é um só, e é aquele para o qual você é conduzido – seja por personagens coadjuvantes, seja por um narrador, seja pela impossibilidade física de seguir caminhos diferentes (mapas muito fechados).
Dá pra argumentar que existem jogos com muitos finais diferentes, e de fato existem, mas eles são variações menores, sempre. E vou arriscar aqui e falar de Heavy Rain – que é um jogo surreal, e tem um monte de finais, e cenas diferentes, e tudo mais, mas parece muito com um filme -, onde seu objetivo é capturar um serial killer, controlando as ações de vários personagens em cenas alternadas, onde tudo converge num climax. Ok, parece bom, né? O problema é que os diferentes resultados são apenas variações da sua habilidade no jogo. Se você limpou todas as impressões digitais ou não, se você consegue operar os controles de forma ágil o suficiente para capturar um fugitivo, se é capaz de seguir as direções indicadas por um GPS, na contra-mão em alta velocidade, essas coisas. São propostas ações que devem ser executadas, mas não há muita variedade de ações simultâneas. Na perseguição, você não pode seguir por qualquer trajeto, assim como o fugitivo não age diferente baseado em sua performance. Na parte das digitais, você só pode ir tentando apagar o que lembra, não tem outra solução como, sei lá, incendiar o lugar, ou estourar um cano, quebrar as prateleiras, essas coisas.
Sei que tudo isso é foda de programar, e fazer essas possibilidades, e mesmo assim, você só teria um número X de possbilidades, previamente escritas. Tá dando pra entender onde eu quero chegar? Um dos jogos mais fáceis de usar como exemplo dessa “liberdade total” seria Minecraft. Onde você está num mundo, e pode fazer o que quiser. Se você quiser cortar uma árvore, corta. Se quiser cavar o chão até o infinito, pode. Nesse processo, pode até achar ouro, diamantes, etc. Não joguei ainda porque essas coisas de ‘possibilidades demais’ acabam me fazendo ultra-viciado, então estou evitando. Mas, por sua vez, com a liberdade, vem uma perda que é a narrativa. Não há uma narrativa pré-definida. Você pode encarar como “a vida de fulano, que precisava sobreviver e se tornar o rei do mundo”, mas não há objetivos outros além dos definidos por você mesmo, tipo a vida.
Bom, agora vamos voltar ao filme do post, porque meu desvio já foi longo por demais, começando pelo trailer.
Edge of Tomorrow (2014), é um filme dirigido por Doug Liman, com Tom Cruise e Emily Blunt, onde a humanidade está em guerra contra uma invasão alienígena (os Mimics). O trailer em si já revela que o filme explora manipulação do tempo, e não é algo incrivelmente novo, porque já tinha sido feito em 1993, em O Feitiço do Tempo (Groundhog Day), com Bill Murray e Andie MacDowell, onde o jornalista Phil Connors revive um dia que ele odeia, muitas e muitas vezes até que ele resolve fazer as coisas de um jeito diferente. É um filme genial, muito divertido, e que me surpreendeu bastante, porque quando achei que já tava acabando, e não tinha mais nada pra acontecer, que ia ficar repetitivo, ainda tinha muita coisa incrível pela frente.
Bom, em Edge of Tomorrow, o botão de reset não é o fim do dia, como em Groundhog Day. É a morte do tenente Bill Cage (Tom Cruise) no campo de batalha. E aí o dia anterior à guerra recomeça, com ele acordando num campo de preparação para o combate. Só ele sabe que o dia voltou, e o que vai acontecer no dia seguinte. E é aí que ele começa a tentar fazer as coisas de um jeito diferente. Nesse processo ele encontra Rita Vrataski, the Angel of Verdun (curiosamente, o par romântico de Phil Connors também se chama Rita, seria uma referência?), que venceu uma grande batalha contra os aliens, e ela explica para Bill o que é que tá acontecendo, e o que ele precisa fazer.
Se você viu Groundhog Day, e achou que o dia se repetia muitas vezes, em Edge of Tomorrow eles brincam com isso, inclusive com uma sequência muito original, meio remix-da-internet, meio treinamento-karatê-kid, afinal, se ele vai reviver aquele dia infinitamente, ele tem todo o tempo do mundo para treinar e ficar realmente bom em combate.
E é aí que vou retomar o assunto dos jogos. Claro, shooters. Muitas vezes você entra num tiroteio de grande escala, e não tem a menor idéia de pra onde ir, que estratégia seguir, onde se esconder, quem são seus aliados, enfim. E aí você morre. E volta para o mesmo ponto, imediatamente antes de começar a bagaceira. E aí, a cada vida, você vai aprendendo os desdobramentos da batalha, e como tirar vantagem deles. Que inimigo aparece quando, onde tá o sniper que sempre te acerta antes que você possa encontrá-lo, quem você precisa salvar pra te ajudar lá na frente, onde se proteger, etc. Tanto que, depois que você passa desse trecho inteiro pela primeira vez, passar uma segunda vez é até engraçado, onde você começa a forçar a barra, e não agir mais com agilidade, e sim com sangue frio, explodindo coisas antes mesmo de os inimigos aparecerem, já os varrendo da face da terra.
E isso é algo que acontece no filme. Bill morre MUITAS vezes no campo de batalha. E a cada tentativa, ele senta com Rita e eles elaboram diferentes estratégias e tentam prever diferentes resultados para conseguir sobreviver à praia. No filme, diferente de um jogo, quando eles saem da praia, eles ainda não estão seguros, e têm MUITAS outras escolhas pela frente, que vão acabar matando um dos dois, ou ambos. Não vou continuar contando a história porque o filme é bem divertido, e diferente do tiroteio-sem-cérebro-e-cheio-de-adrenalina que eu tava esperando (tanto que está com notas altas no IMDb e no Rotten Tomatoes).
Como se não bastasse o grande número de assuntos e coisas confusas nesse post, vou colocar mais uma, porque se relaciona com tudo, e dá um pouco de esperança para o universo dos games. E essa esperança é The Stanley Parable. Uma modificação de Half Life 2, que tem tantas narrativas possíveis e escolhas, que você se sente de alguma forma, no controle.
O jogador controla o tal Stanley, que tem todas as suas ações descritas por uma narração. Tudo vai bem, até o jogador chegar em sua primeira escolha: um par de portas, uma na direita, e uma na esquerda. A voz diz que Stanley sabe para onde quer ir, e segue pela porta da esquerda. Mas aí, cabe a VOCÊ decidir se vai mesmo fazer o que voz está sugerindo, ou se vai pela porta da direita. E, baseado nessa escolha, muitas outras vão surgindo, e você nunca sabe de fato o que aconteceria se seguisse pelo outro caminho. Todas as portas que você cruza se fecham atrás de você, e não tem como voltar atrás.
O jogo tem DEZOITO finais diferentes, alguns deles absurdamente improváveis (como um final para quando você tenta usar um cheat code, ou um no qual você precisa jogar um jogo de apertar botões por QUATRO horas. Qualquer pessoa normal jogaria um pouquinho, depois desistiria de continuar naquela atividade entediante, mas um usuário resolveu testar a proposta, e programou seu teclado e mouse para executarem os comandos automaticamente, por mais de quatro horas. Surpresa! Existia MESMO um final diferente pra isso!). E a cada “rodada”, o narrador vai perdendo o controle sobre o que você tá fazendo, e sobre qual caminho seguir para que a história se desenvolva (numa delas, acabei dentro de Portal, em outra, era Minecraft). É surreal, e traduz de forma palpável aquela coisa louca toda de “cada escolha traz um resultado diferente”, que só pode ser alcançada com jogos, e passa longe de filmes, ou livros, ou qualquer narrativa tradicional.
Bom, estava eu, jogando, ontem, quando cheguei num final em que Stanley entra num museu, que tem várias coisinhas relativas ao desenvolvimento do jogo. Mapinhas, equipe de desenvolvimento, curiosidades, modelos, os botões que podem aparecer ao longo do caminho, etc. E nesse museu, me deparo com essa “escultura”, explicando que originalmente eles tinham um final onde Stanley estaria numa praia, combatendo uma invasão alienígena.
Hmm… que curioso, um jogo cujo princípio é justamente de recomeçar over and over again, e mudar suas escolhas para diferentes resultados, tinha um final que é basicamente idêntico ao que acontece em Edge of Tomorrow, um filme que gira em torno do mesmo princípio! Depois o filme desenvolve em outros cenários e assuntos, mas a semelhança é muito peculiar!
Bom, estão aí dois filmes e um jogo muito bons, para quem tiver tempo livre para experimentar novos conceitos. Mas, principalmente o jogo, sério.
Mesmo com tantos apetrechos que podem incrementar nossa visão, nossos olhos já são bem incríveis. Um problema é que, a partir de certa idade, é comum o enrijecimento das membranas do olho, causando presbiopia. A consequência mais notável da presbiopia é que ler e escrever se tornam tarefas muito mais cansativas, uma vez que é preciso aplicar muito mais força nos olhos para conseguir focar aquelas letrinhas pequenas tão próximas. A solução são os óculos de leitura, que tem como função tornar visíveis detalhes mais próximos dos olhos. A intensidade da correção óptica de quaisquer óculos segue um padrão: aqueles numerozinhos que todo mundo chama de “grau”, mas ninguém sabe a medida, são dioptrias. Não vou entrar nos detalhes matemáticos e físicos dessa conta, mas é relativamente simples.
Ok, e como é que os óculos de leitura e essas tais de dioptrias entram na fotografia? Sabe aquele filtro estranho, que parece uma bolha de vidro, e que muita gente chama de filtro macro? Então, ele também atende pelo nome de close-up – ou dióptro – e funciona de forma idêntica a um óculos de leitura para a sua lente fotográfica. Close-ups são lentes auxiliares que podem ser compostas de um único elemento óptico ou dois elementos (são os chamados “acromáticos”).
Assim como os óculos, close-ups são classificados de acordo com sua força, em dioptrias. Temos valores de +0.25 até +10. Um close-up é sempre colocado em frente a uma lente e o seu efeito é “limitar” a distância atingida com o foco no infinito. O “novo infinito”, é bem mais próximo e representa a máxima distância focável, podendo ser calculada de acordo com a intensidade do filtro. A matemática é bem simples, mas precisamos definir duas variáveis.
MaxF = máxima distância focável, medida em metros
S = força do close up
Dá pra entender daí que quanto maior a força do close-up, mais próximo é seu foco máximo. Existem então duas conseqüências muito óbvias. A primeira é que não dá para fazer foco em nada além da distância calculada. A segunda é que as marcas de foco existentes lente não indicam as distâncias corretamente. Seria necessário fazer uma proporção adequada ao novo infinito da lente, mas isso não é fundamental. É só ir ajustando no olhômetro mesmo pra ver quando tá em foco. Para cenas próximas, uma boa técnica é fazer foco no infinito e movimentar a câmera até que o assunto entre perfeitamente em foco. Sua movimentação não deve passar de uns poucos centímetros.
A aparência do filtro, aquela bolha de vidro, muitas vezes bastante acentuada, já indica onde ele vai pecar: a curvatura do centro estará perfeita e tudo que for fotografado naquela parte do quadro vai apresentar grande qualidade de imagem, mas conforme vamos para as bordas e cantos da fotografia, não é preciso muito esforço para notar a intensa aberração cromática e perda de definição.
E o que os dióptros de dois elementos, ou acromáticos, têm de tão especial? Esses surgiram voltados para aplicações que necessitavam de grande qualidade ainda que a curtíssimas distâncias – por exemplo, microscópios, ou lentes de cinema – e, claro, acabaram ganhando versões para o mercado fotgráfico. A função do segundo elemento óptico é justamente de corrigir a aberração cromática e perda de definição causadas pelo primeiro elemento. O ganho na qualidade da imagem é incrível, assim como o aumento dos preços!
Através do uso desses filtros, abre-se um mar de possibilidades como, por exemplo, usar uma daquelas super-teles, que falamos um tempo atrás, para fazer imagens “macro” sem a necessidade de chegar tão perto do assunto fotografado, e driblando sua limitação de foco mínimo! O ângulo de visão reduzido da lente, combinado com o “novo infinito” proporcionado pelo close-up acabam resultando em um fator de ampliação do assunto.
Outra coisa muito curiosa que é possível através de close-ups parciais (metade do filtro é vazada, sem vidro algum), é ter foco em distâncias completamente diferentes numa mesma imagem. Orson Welles utilizou bastante essa técnica em vários de seus filmes para conseguir foco simultâneo em personagens que estão em primeiro plano e em personagens bem afastados da câmera.
Pronto, agora você já sabe o que fazer quando sua câmera estiver com a vista cansada, se recusando a focar objetos realmente próximos!
Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #26, em Outubro/2013
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