Day-to-Day

The 100.

April 30, 2015

Não é do meu feitio dar mais de uma chance quando tento começar a assistir uma série. Ou me convence de cara, ou cai no esquecimento e eu não termino nem o primeiro episódio. Já perdi a conta de quantos pilotos eu abandonei no meio. Tendo essa informação, o caso de The 100 é bastante (BASTANTE) peculiar.

Março de 2014, The Last Of Us tinha saído alguns meses antes, e eu já tava alucinado com o jogo, por tocar um conceito de universo pós-apocalíptico muito interessante. O jogo se alinhava um tanto com Revolution (que estreou quase um ano antes), uma série baseada na idéia de que, um dia, subitamente a eletricidade cessou de existir, e a humanidade teve que se adaptar pra sobreviver. Revolution tinha (morreu, coitada) sérios problemas, e não consegui continuar acompanhando a série quando a segunda temporada começou justamente por achar mais defeitos que qualidades.

Temas pós-apocalípticos me interessam desde antes dessa febre zumbi “iniciada” com The Walking Dead, e em minha opinião, independem de zumbis ou monstros. Pra mim, quando mais pautada na realidade, melhor a série. The Last of Us tem zumbis, mas não é uma série, e é uma história tão bem amarrada que não tem como não se apaixonar. Agora que essa introdução confusa já tá explicada, voltemos à estréia de The 100.

Quando a série estreou, a gente tava na véspera de começar a rodar a primeira temporada do Zona SSP. Quando li a premissa de The 100 – daqui a não-sei-quantos (acho que 300) anos no futuro, uma guerra nuclear acabou com a civilização na Terra e os únicos sobreviventes da humanidade eram aqueles à bordo de estações espaciais. Quando a série começa, essa mega-estação está passando por crises com volume populacional e oxigênio disponível. É preciso reduzir a população e para tal, eles decidem mandar cem criminosos para a Terra, tanto como punição como para descobrir se o ambiente já é “sobrevivível”. Até aí, bacana. Minha birra começou quando descobri que os 100 condenados eram praticamente adolescentes, em seus quase vinte anos.

Lembrei de Jogos Vorazes, onde tanto o livro como os filmes não tinham decepcionado, apesar da idade dos protagonistas, e tentei superar essa birra inicial, continuei assistindo o piloto. Primeira coisa que a galera faz quando chega no chão: festa. Porra, sério? Ambiente hostil, e vocês vão fazer festa? Depois começaram os draminhas românticos de “fulano é a fim de sicrana que é a fim de beltrano” e por aí vai. Depois impliquei que todo mundo tava sempre muito limpinho e bem cuidado, e tudo lindo e maravilhoso – essa era meu maior problema visual com Revolution, os personagens estavam sempre limpinhos, não importa o que acontecesse, eles ficavam um pouco pintados de carvão quando algo explodia nas redondezas, mas isso era tudo.

O piloto termina quando um dos cem é atingido por uma mega lança, arremessada por algo que parece um macaco gigante. Planeta dos Macacos agora? Achei os efeitos visuais fuleiros, não fui muito com a cara dos personagens, achei os dramas muito adolescentes e só curti mesmo a premissa, mas não como tinha sido desenvolvido. Triste e decepcionado, abandonei o show.

Quase seis meses depois, já aqui em Vancouver, a segunda temporada da série se aproximava do fim e lendo um review sobre as melhores séries do ano, lá estava The 100. Fiquei MUITO curioso com isso. Como aquela porcaria tinha ido parar numa lista dessas? A review falava maravilhas de muitas coisas e achei tão convincente que dei mais uma chance – tava disponível no Netflix, e isso é sempre um incentivo. Odiei tanto o primeiro episódio que não tava disposto a passar pelo stress de novo. Comecei direito no segundo, porque lembrava vagamente dos eventos.

O segundo episódio também era uma desgraça. Eu não costumo assistir séries enquanto faço outras coisas – trabalhar no computador, ler, escrever, whatever – e fiz isso com o segundo episódio, porque tava começando a ficar com raiva pelos mesmos motivos do piloto. Faltando sete minutos pra acabar, desisti.

Mais seis meses se passaram e, um dia, voltando da aula de noite, conversando com o Nicko e falando do Zona SSP, ele disse que tava vendo The 100 com a Nat e que a série tinha MUITO em comum com o nosso projeto. Fiquei encucado, mas ainda não aceitei que o diabo da série podia ser boa depois de duas decepções tão grandes. A Nat então explicou a teoria dela de três episódios. O primeiro e o segundo episódios de qualquer série geralmente são péssimos, mas tem como função apresentar o universo onde a história vai se desenvolver. Se no terceiro episódio a coisa não tiver engrenado ainda, é aí que ela desiste. Não pretendo adotar essa teoria, a menos que muita gente me indique um show em particular. Como já tinha visto 2 episódios e só faltava um pra me livrar definitivamente dessa, algumas semanas depois, num momento de tédio, retomei o final do segundo episódio e emendei no terceiro.

Aí fodeu. No mesmo dia eu parei lá pelo oitavo. Outro dia tedioso e vi mais sete episódios seguidos. Hoje vi mais cinco. Faltam três episódios pra chegar no final da segunda temporada. A série é incrível. Tudo que eu tinha de reclamação foi resolvido. Na verdade, tá num ponto onde todos os caminhos envolvem decisões e consequências incrivelmente cruéis ou fatais. Todos os personagens chave já apanharam tanto e bateram tanto uns nos outros e em terceiros que em certos momentos é difícil ler as expressões faciais por baixo das camadas de ferimentos, sangue e sujeira.

Além dos 100 originais – onde pelo menos mais da metade já foi dizimada -, mais gente da estação espacial entrou em jogo, outros grupos (facções?) humanos entraram em contato (todo mundo querendo matar geral), e tem mais outros tantos que a gente só ouviu falar. Em alguns momentos a série me lembra Jogos Vorazes, mas principalmente o terceiro livro, quando é guerra declarada contra a Capital. Em outros momentos fico impressionado com o nível de violência no mundo da série, e em muitas ocasiões fiquei impressionado com decisões tomadas a respeito do destino dos personagens.

No começo da série rolavam muitos flashbacks meio explicativos das histórias dos personagens enquanto viviam na estação espacial. Conforme a narrativa evolui, esses flashbacks vão diminuindo em volume e duração, o que é uma alegria. Uma coisa que acontece bastante em The 100 é achar que o personagem vai morrer, porque não tem como escapar – e não é nem escapar de uma situação, mas sim das consequências, como ferimentos, vírus, fogo, ácido, etc – e o desgraçado consegue sobreviver, e pior ainda, de forma bem aceitável, sem parecer deus ex machina pra salvar um elemento chave.

Enquanto escrevia esse post, percebi que a série não tem grandes perguntas, tipo LOST, onde não dá pra explicar nada. The 100 tem tudo relativamente bem explicado, e me prendeu não por não saber explicar determinado acontecimento, e sim porque eu sempre quero saber o que vai acontecer depois, que decisões os personagens vão tomar e quais as consequências disso. Diferente de The Walking Dead, onde sempre tem um núcleo onde quase nenhuma ação acontece, em The 100 todos os núcleos estão sempre lutando com força total pela sua sobrevivência. Outro ponto positivo é que acho que 90% das posições de liderança entre os personagens são ocupadas por mulheres – definitivamente algo diferente do padrão, e uma mudança bem aplicada.

Bom, não sei encerrar o post mas não queria enrolar até terminar a temporada pra escrever porque ia acabar esquecendo de pontos interessantes. Vira e mexe ainda aparece um diálogo explicativo, ou uma cena com a luz MUITO estranha (leia-se: a noite no deserto, no episódio 12 – se não me engano – da segunda temporada), mas são situações tão passáveis no quadro geral da narrativa que nem incomodam. Fica aqui minha reflexão sobre uma série que me decepcionou terrivelmente duas vezes e depois provou seu valor superando muitas outras que eu ainda assisto. Se você leu esse post e for tentar assistir, não desista no primeiro e no segundo episódios. É difícil, eu sei, MUITO difícil, mas dá, e o que vem depois compensa o sacrifício.