Day-to-Day

UP17 – Flares

July 28, 2014

Retomando a coluna do mês passado, dessa vez teremos mais detalhes sobre as coberturas que são aplicadas aos elementos ópticos das lentes visando melhorar sua qualidade e, ainda mais importante, seu rendimento luminoso.

Ao final do século XIX, a fotografia se desenvolvia a passos largos, tanto na forma de arte como na forma de ciência. Projetos de novas lentes surgiam a lentamente, resultados de muita matemática, física e cuidado artesanal na hora de cortar e polir cada elemento de vidro que seria utilizado em sua construção. Um verdadeiro tesouro, mas longe da perfeição.

Um problema ainda sem solução era o fato de que entrava muito mais luz pela abertura da lente do que a luz que era projetada na forma de imagem sobre o filme. Essa dispersão decorria, principalmente, da diferença entre o índice de refração do ar, e do vidro, os dois meios que compõem uma lente. A cada elemento óptico atravessado pela luz, parte dos raios luminosos se dispersava devido à curvatura do vidro e ia parar longe de seu foco, mas ainda incidindo sobre o filme. O resultado dessa dispersão: raios desordenados, ricocheteando de um lado para o outro nas superfícies internas entre cada elemento óptico e chegando ao filme, onde provocavam grande perda de contraste e cor nas fotografias – aquele flare esbranquiçado que, de vez em quando, aparece numa foto.

Como o vidro não tinha qualquer tipo de proteção ou cobertura, conforme envelhecia, era comum que surgissem manchas em sua superfície. Em 1886, Lord Raileigh pesquisava uma forma de combater essas manchas quando descobriu que o vidro manchado transmitia mais luz do que o vidro limpo, novo, e que as manchas melhoravam a transição entre os meios físicos ar – vidro. A partir daí, a química tomou conta e foram-se descobrindo que camadas finíssimas, de materiais específicos (metais raros, em sua maioria), aprimorava essa transmissão de luz, além de eliminar reflexos indesejados e filtrar cores específicas. Para visualizar isso com clareza é só olhar o reflexo de uma fonte de luz sobre o elemento dianteiro ou traseiro de uma lente: esse reflexo nunca é “da cor da luz”. A tendência atual é que ele seja verde, ou lilás, devido ao fluoreto de magnésio empregado nas camadas superiores.

O nome “multi-coating” vem do fato de serem diversas dessas camadas, com espessura de alguns poucos nanômetros, fazendo os degraus entre o índice de refração do ar (1.0) e o do vidro (1.6) e garantindo menos dispersão de luz, proteção contra flares e até mesmo contra pequenos riscos. Essas camadas são presas ao vidro através de um processo físico de metalização em alto vácuo que garante que elas não vão se soltar sozinhas, cair ou se desfazer com o tempo.

Mesmo com toda essa proteção, existem fontes de luz tão intensas que, quando expostas numa fotografia, provocam flares, mas agora de forma muito mais controlada do que aqueles encontrados no começo do século. É comum que esses flares sejam pequenas manchas coloridas, bem definidas, no formato da abertura da lente (pentágonos e hexágonos são as formas mais comuns). A variação de cor de cada manchinha é dada justamente pelos diferentes elementos utilizados em seu coating, em combinação com a qualidade e cor da fonte de luz. O número de manchas também varia bastante, de acordo com a lente utilizada.

O ponto agora é saber lidar com essa característica. Não é necessariamente um defeito, quando trabalhada de forma criativa. Mas, se for um defeito, também já temos as ferramentas de como combatê-lo, especialmente se a fonte de luz não estiver aparecendo na fotografia, estiver acima, abaixo ou nas laterais do quadro: é só colocar a mão para cobrí-la!


Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #31, em Março/2014