Day-to-Day

New York – Bonus Six.

March 23, 2013

Só hoje, no sexto dia, resolvi que era uma coisa decente ir ao cinema em NY. Não sei, pensei que ia ser igual a qualquer lugar do mundo, só que sem legendas. Não podia estar mais enganado. Agora tô dando graças aos céus de só ter ido hoje, porque se fosse no primeiro dia, todos os outros eu ia passar no cinema.

Comecei meio desanimado, porque não tinha nada muito incrível em cartaz. Por fim, me decidi por um, e joguei no Google Maps: “movie theater”. Trocentos pontinhos surgiram. Acho que tem mais salas de cinema nessa ilha minúscula do que em toda a cidade de São Paulo (esse é um “acho” com grande porcentagem de certeza). Fiquei entre três opções, uma 34th, um na 42nd e um na 68th, mais perto de casa. Por preguiça de muvuca, resolvi ir nesse mais próximo. O filme era The Call, e começava às 7h30pm. Saí de casa num horário bem adequado, com tranquilidade – até parece – às 7h10pm. Corri esbaforido até o metrô.

Tem uma coisa que eu esqueci de contar sobre o metrô. TODOS os dias, quando eu chego na estação e começo a descer as escadas, tem um trem saindo e eu nunca consigo pegar. Já com isso em mente, pensei que se fosse correndo, ia chegar a tempo de embarcar. Não deu outra. Cheguei na hora que as portas abriram, mas só faltavam quinze minutos pro filme começar, a 40 quadras de distância. Saí do metrô que nem uma bala, tentando não atropelar as pessoas na rua e correndo para atravessar – não tinha feito isso ainda. Comprei meu ingresso às 7h32pm. Ingresso caro da desgraça, me custou 14 doletas.

O espaço do cinema (um da rede AMC Loews) era totalmente decorado com um tema meio inca, meio celta, até pros nomes das salas. As paredes tinham entalhes de pedra, e a iluminação era delicada. Clima bacana. Entrei na sala, tava bem cheia. Me espremi entre dois casais, numa fila bem pra frente. Não perdi nem os trailers. Aí começou o espetáculo. O primeiro trailer foi de Gatsby, que vai ser um filme foda. O segundo, de Iron Man 3, depois, Kick Ass 2, seguido de Evil Dead. Tinha alguma coisa nesses trailers que tava sendo mais emocionante do que ver trailers nos cinemas do Brasil, e não era só a ausência das legendas. A legenda É mesmo uma muleta, então, sem ela, você se concentra muito mais no som, e nas cenas. Não consegui disfarçar o sorriso assistindo aos trailers.

Até a propagandinha da sala, sabe, de “desligue o seu celular”, etc etc, era muito bem feita, sem essas coisas bizarras de pipoquinha andando, ou pichações que saem da parede – pessoas, me perdoem, mas eu acho essas paradas muito toscas. É muito educativo, é falso, ninguém liga praquilo. Aqui era com personagens de uma animação que tá em cartaz, e uma situação clichê, mas bem executada, divertida. Ele não faz você lembrar que é ruim usar o celular na sala só porque é ruim. Há um clima de comédia, que, ao passar pela cena, você lembra do celular involuntariamente. Como diria Lila, it’s made to stick. And it sticks.

A sala era muito boa, com caixas de som de qualidade superior a todas as salas de São Paulo – convenhamos, é uma desgraça, o som vaza de uma sala pra outra! Só o IMAX escapa. A projeção digital, sem arranhões de película, também era mais imersiva, e a proximidade da tela (a sala era pequena, não em formato de arena, como costumamos ter no Brasil, e sim algo na linha HSBC Belas Artes) influenciavam no clima.

Começa o filme. Vou fazendo um resumo muito breve, cheio de spoilers, porque preciso ressaltar pontos importantes. É tipo um “Por Um Fio” às avessas. The Call conta a história de Jordan, uma operadora da central telefônica de emergência (911) de Los Angeles. Ela recebe uma ligação de uma menina, faz merda, a menina é sequestrada e morta. Ela não consegue lidar com a pressão e se demite, passando a treinadora de futuros operadores. Num desses treinamentos, uma colega iniciante recebe uma ligação crítica, de uma garota sendo sequestrada, e Jordan (Halle Berry) assume o lugar dela, guiando a garota.

Inicialmente, Chasey (a garota) é colocada num porta malas, e o celular não tem chip, então não é rastreável. Claro, o sequestrador é o mesmo que matou aquela outra garota. Jordan então vai acalmando a menina e dizendo o que ela deve fazer. Ela quebra o farol traseiro do carro, e começa a jogar tinta na pista. Em paralelo, Jordan vai passando informações para a polícia, enquanto tenta identificar o carro em meio à cidade, e a identidade do sequestrador.

A garota tenta fugir umas três vezes. Na segunda, o bróder dá um murro na cara dela. Nessa hora, O CINEMA INTEIRO fez um “oooouch!”. Não foi uma pessoa, nem duas. Foram TODAS. A tensão vai crescendo, o cara desliga o telefone e Jordan vai procurar a menina no último lugar que tem rastros. A polícia já não tinha encontrado nada. As pessoas no cinema iam se descontrolando. Ouvi muitos risos nervosos, e comentários do tipo “don’t go there”, “oh my god”, “He’s gonna get her!”. Os sustos não decepcionam, e não falham. No fim, as duas escapam – eles estavam num alçapão subterrâneo – e o bróder cai lá dentro, desmaiado. Jordan pega o celular para ligar para 911, quando a menina diz pra ela esperar.

Aqui foi a única parte do filme que me surpreendeu. Em condições normais, ela diria pra menina que a coisa certa é ligar, que ele vai ser preso e pagar pelo que fez, etc etc. Mas não. O bróder acorda, amarrado numa cadeira, nesse subsolo. As duas estão olhando pra ele, ele faz umas gracinhas com Jordan e diz que elas não podem deixar ele ali, que precisam chamar a polícia. E elas não chamam, e vão embora, deixando o bróder pra morrer lá dentro.

De todo o processo, a experiência mais incrível foi sentir as reações das pessoas. Numa hora que Jordan nocauteia o vilão, as pessoas aplaudiram! Sinto falta disso no nosso cinema, de envolver as pessoas. Comédia faz sucesso, ok, mas comédia é ir pro bar e ficar bebendo e contando piada. Resolvi fazer cinema pra divertir as pessoas com coisas que não são presentes no seu dia-a-dia. A única vez que vi reação parecida com essa, foi no mega-hit, sucesso imbatível, Tropa de Elite 2, quando Capitão Nascimento desce a porrada no político. É catártico, o cinema também pode ser um lugar de catarse.

Se aqui, com um filme qualquer, as pessoas estão se envolvendo, por que a gente não consegue fazer isso nem com as mega produções? Se eu tivesse que apostar, não diria que o problema está no público, e sim na mentalidade dos realizadores. Não vou entrar nessa discussão, mas vou falar do que eu quero fazer.

O principal motivo de ter saído de Salvador pra estudar é porque não tinha mercado pro que eu queria. Em São Paulo, tem um mercado de cinema e AV, mas agora que eu tô me dando conta, não é o mercado que eu quero também. A solução é migrar. Não é tão fácil quanto se escrever, mas escrever já é o começo.

Um bocado de gente já me perguntou: “e você pretende voltar, quando se formar, pra fortalecer o mercado lá?”. Para esses, respondo: Meus queridos, me perdoem, mas eu não sou o messias. Olha pra minha cara, e vê se eu tenho jeito pra fortalecer mercado. Eu não quero nem pensar em logística. Eu só quero fazer filmes, me divertir no processo, e – principalmente – que o resultado divirta as pessoas tanto ou mais quanto me divertiu! Mais especificamente, eu quero fazer filmes de ação, aventura, ficção, que envolvam efeitos visuais, mas o mercado brasileiro não tá preparado para uma linguagem de ação nacional, e não sou eu a pessoa que vai criar isso – deixo para colegas mais teóricos, que gostam de discutir as coisas.

Nesses últimos meses eu já tava ficando com a sensação de que São Paulo não era meu destino final, e agora, depois de assistir esse filme aleatório, que provavelmente tem muito menos significado planejado do que teve pra mim, tenho certeza que São Paulo não é o último ponto da estrada. Ainda vou sair, não sei exatamente quando, nem como nem pra onde, mas vai rolar e não há de estar tão longe! E sei que não vou sozinho.

  • adonaifc March 24, 2013 at 12:13 am

    Acho que compensa muito passar um tempo e se envolver com a coisa lá fora, mas a concorrência tb é enoooorme, porém as ferramentas estão na nossa frente, vc foi vender uma anamórfica longe do Brasil, o espaço existe!! Fazer um curso de cinema reconhecido mundialmente não é assim tão difícil. O difícil é se envolver positivamente com a coisa, estar sempre colocando as coisas pra frente, isso é importante, há pouco tempo uns caras do meio que por ex, dão dicas hoje sobre anamórficas, não eram nada, e agora são os “caras” bem tratados pelas empresas, com opiniões que são ouvidas, não demora pra estarem a frente de projetos sólidos, mas esses caras tem que ser bons, ninguém aguenta porcaria muito tempo! :)

  • May March 24, 2013 at 1:02 am

    “E sei que não vou sozinho.” <3

  • May March 24, 2013 at 1:12 am

    aaaah, mas eu discordo! você pode mudar as coisas, sim! e vai querer depois de algumas experiências, pode apostar.

  • mangarosaweb March 24, 2013 at 5:40 pm

    Informações pouco úteis: o título do filme no Brasil será “Chamada de Emergência”. Aquela jovem enfiada no porta-malas é aquela garotinha de “Pequena Miss Sunshine” que agora está bem crescidinha.

  • Lila March 25, 2013 at 5:34 pm

    “Meus queridos, me perdoem, mas eu não sou o messias.” adotada de imediato.

  • Fiuza April 12, 2013 at 4:31 pm

    Ri demais com o “Meus queridos, me perdoem, mas eu não sou o messias.”

    Sobre sua ida, digo que vá, mas antes dê seus pulos e filme Cinderela Baiana 2.