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Day-to-Day

Day-to-Day Tudo AV

Ruas do Cinema

November 29, 2013

Esse documentário começou a ser feito em 2011 e tá se arrastando na finalização há muito tempo, mas enfim, está pronto! Fizemos como parte das disciplinas de Documentário e Montagem, e fomos atrás de investigar a extinção das salas de cinema de rua, mais especificamente no centro de São Paulo – mas não restrito a essa área ou cidade.

Num processo de mais de seis meses, fizemos pesquisas e entrevistamos pessoas com boas experiências e argumentos sobre o tema. Além disso, passamos várias noites filmando os arredores do nosso cinema-caso, que era o Unibanco da Augusta (e que agora é Itaú, mas enfim, é o mesmo em todos os aspectos). Demoramos tanto no final, que o cinema até mudou de nome!

Foi uma das experiências onde mais aprendi sobre fazer filmes, sobre fotografia, sobre cinemas de rua (hahaha), e uma pá de outras coisas. Tenho bastante orgulho desse projeto. Recentemente, no aniversário de 20 anos do cinema na Augusta, fomos convidados a exibir o filme numa sessão especial que aconteceu por lá, e finalmente vimos algo verdadeiramente nosso numa telona. A sensação é incrível – incluindo toda a preocupação de “e se as pessoas não gostarem?”. É pra isso que a gente faz cinema, no fim das contas, né?

Day-to-Day

Enfia a marreta no…

November 28, 2013

Tô puto, e pensei muito antes de escrever esse post, mas achei que seria menos agressivo colocar isso aqui do que comprar uma marreta e começar a bater no chão. Então vamos lá.

Aqui onde a gente mora, por ser apartamento, existe um vizinho de baixo.

Logo que a gente se mudou, o sujeito interfonava DIRETO, pra reclamar que a gente tava andando de salto pela casa, de manhã cedo. Só pra começar, ninguém aqui usa salto. Depois, era pra reclamar que a gente tava arrastando os móveis na segunda de manhã, pra limpar a casa, enquanto ele trabalhava no domingão à noite. Fizemos VÁRIOS testes de barulho, inclusive fomos à casa dele, enquanto um de nós literalmente pulava e jogava coisas no chão pra ver se dava pra ouvir lá de baixo. Nada.

Depois de muito tempo, descobriu-se que o barulho magicamente vinha do andar acima do nosso, atravessava um portal mágico, a gente não ouvia, e o de baixo ouvia tudo. Estranho, mas enfim, paramos de ser importunados. Aí um dia, começou uma obra no andar de baixo. Bom, levamos numa boa. Era começo de Julho, ou Agosto, já não lembro mais.

O bate-bate começava pontualmente às nove, e parava às cinco da tarde. Passou-se uma semana, duas, três, um mês. Aí tivemos um acontecimento relevante: com a força das pancadas no andar de baixo, um de nossos pratos rolou e caiu da prateleira onde ficava guardado. Interfonei, falei com o bróder que tava batendo, e ele disse que ia tentar bater mais baixo. “Tentar bater mais baixo”, balela pura. O sujeito continuou marretando que só o inferno, e pra não se desgraçar mais, tiramos TODOS os quadros de todas as paredes e pratos do armário, colocando tudo em superfícies planas e seguras.

Outro ponto relevante: a maioria do tempo, a gente trabalha em casa, até altas horas da noite. Editando, finalizando, correção de cor, gravando som, lendo, escrevendo, etc. E fazer qualquer uma dessas coisas com um barulho do cão ao redor é incrivelmente mais desafiador. Sem falar que dormir além das nove também é absolutamente impossível.

Nas semanas seguintes, mais DOIS pratos se suicidaram. A gente interfonou, pra pedir pra maneirarem, e a resposta não foi a mesma. Agora foi “infelizmente não dá pra bater mais fraco”. Aí a porra da obra já tinha dois meses, e chamei a síndica, pra entender qual era a parada. Ela chamou um dos pedreiros, e o sujeito chegou aqui morrendo de medo. Combinamos que eles pagariam um conjunto de pratos novo pra gente, e ficamos sabendo que a parte barulhenta acabaria naquela semana mesmo.

Adivinha só? Mais balela. Isso foi há dois meses. A variedade de ferramentas é incrível. Martelos, marretas, furadeira, makita, britadeira e o cacete. Acho que o apartamento não tem mais nenhuma parede, porque o tanto de coisa que esses caras já derrubaram não CABE no espaço do prédio.

Hoje tô escrevendo isso com música tocando em um volume absurdo, só pra ver se alguma coisa chega lá embaixo. É impossível ver filme, tv, ler ou qualquer outra coisa que exija algum nível de silêncio. Então, pra não entrar na vibe da vingança sem graça, estou aqui abrindo sugestões de coisas maravilhosamente barulhentas e divertidas para se fazer TODOS OS DIAS DA SEMANA, A PARTIR DAS 9h01 da manhã. Especialmente às segundas feiras.

Já temos na lista jogar Just Dance, para Nintendo Wii, e organizar um concurso de sapateado entre amigos. Alguém tem mais? Afinal, a gente tem direito de fazer barulho a partir das 9. Se é por uma boa causa ou não, já não é da conta de ninguém.

Anamorphic Day-to-Day Tudo AV

No Meio da Noite

October 20, 2013

Como apresentado em meados de Fevereiro ou Março, nesse post, foi mais um extra que a gente fez lá pela USP, por nossa conta mesmo, equipe mínima, tudo em uma diária, e por aí vai, procedimento padrão de quem não tem dinheiro.

Admito que ficou pronto até “rápido”, só seis meses, bem menos do que o tradicional “um ano” que tem aparecido por aqui!

Em um resumo breve, é um roteiro da Carol, no mesmo esquema do 20h20, dois atores, uma locação – ok, foram duas – alguns diálogos, e pronto.

A parte mais complicada desse filme todo foi fazer o caixão caber dentro do carro – um Nissan March – para transportar ele de um teatro no centro da cidade até a USP, e depois de volta. Nesse filme, o pobre do March revelou seu valor, transportando gente, caixão, mesa, o diabo todo que eu nunca imaginei que coubesse lá dentro e muito mais.

Mas sim, voltando ao assunto do filme, fotografei esse também com lentes anamórficas, majoritariamente o Century, close ups diversos (para conseguir foco em situações não usuais) e as lentes russas (37mm, 58mm e 85mm). O Pedro Fernandes me deu uma grande força nesse processo, correndo pra lá e pra cá com filtros e lentes, e nossos únicos refletores – emprestados – de 100w e 300w. Tem até um flare fetichista no finzinho, coisa fina!

Foi um filme muito divertido de fazer – inclusive porque todo mundo era um pouco “produção”, além de sua função original, pra dar uma mão pro Victor, que tava sozinho responsável pelo circo todo!

Anamorphic Day-to-Day

[Título Provisório]

October 14, 2013

Ontem teve set. Set daqueles que não tinha há muito tempo. Ficção. Nada de empresários, depoimentos, vinhetas, etc. Ficção pura, com atores e equipe pequena. Foi tanta coisa nova em teste no filme, que não sei nem por onde começar. A parada começou pra uma das optativas livres que tô fazendo nesse semestre, e que tem a turma mais aleatória de todas – cada um veio de um canto da USP, procurando coisas bem diferentes. A maioria sem nenhuma experiência em set.

Peguei toda minha vontade recente de fazer qualquer coisa e concentrei nesse projeto. É pós-apocalíptico, inspirado por acontecimentos recentes em São Paulo, anamórfico, raw, e com um bocado de pós-produção. Ah, é uma série, e não um curta. Se vai ficar bom, já são outros quinhentos, mas até agora foi bem bacana de fazer. O roteiro é de minha autoria – depois de duzentos anos só escrevendo nesse blog e na OLD – assim como a direção de fotografia e a direção geral – essa contava com opiniões de todos os envolvidos.

Enfim, ontem chegamos cedo ao Paço, nossa locação favorita, e começamos a rodar de fato perto das 9h. A câmera deu pau trocentas vezes ao longo do dia, mas nada definitivo. Era só reiniciar, tirar bateria e cartão, e continuar a brincadeira. Na sexta-feira eu saí correndo atrás de cartões e baterias extras – os meus não eram nem perto de suficientes – e pude contar com a ajuda do Nicko e do Plínio nesses itens.

Usamos a LOMO Foton-A, num rig de ombro que passava fácil de 8kg, que carreguei o dia inteiro, subindo e descendo escada, entrando e saindo da água, fazendo tudo que uma câmera tem direito. Foi um ambiente hostil, nesse aspecto. Com medo de lotar os cartões antes da hora, acabei que só tirei três (!) fotos durante o dia todo, e elas já estão logo aqui embaixo.



Na equipe, a Victoria Segovia comandava nossos horários, continuidade, todas as anotações possíveis e imagináveis, e dava uma mão com os atores e a arte. Paulo Chou foi o camarada do som, e que vai montar a parada – e sofrer horrores pra sincronizar o que é útil. André Rosa, expert em fogueiras e montador da abertura do primeiro episódio. André Akel, que tava controlando as baterias e cartões, e passando um olho no processo de logar o material, Alexandre Amêndola, que deu uma grande força com a parte de foto, passando foco em vários planos e ajudando em tudo que aparecia. Luciana Parelho, comandando a Arte, com figurinos e maquiagem sensacionais. A Lucia Marques foi nossa produtora, trazendo a comida, resgatando figurinos e vigiando a base – a gente quase se mudou pro Paço, de tanta tralha que tinha lá! Sr. Antônio tava com sua câmera por lá também, fazendo making of das nossas maluquices, e até a Ana Catarina apareceu de manhã pra passar o olho no que tava rolando.

Domingo que vem a gente roda a segunda parte – o trecho noturno do segundo episódio – e tô animado pro que vem. Já tá fazendo o semestre valer a pena, além das outras aulas divertidas, que me obrigam a sair de casa e pensar no que fotografar.

Em termos técnicos, sem a parte de luz, tô pondo em prática tudo aquilo que tá escrito no meu TCC, e que pretendo levar a cabo nos outros projetos, em Dezembro, mas que dependem bastante da duração dessa greve. Já passamos o workflow todo, testemunhei os pepinos de set, entendi como contorná-los, e por aí vai.

Day-to-Day

UP10 – Lentes Catadióptricas

October 12, 2013

Super-teles são lentes que trazem para pertinho coisas que estão acontecendo a uma distância consideravelmente grande. Fotografar buracos na Lua ou animais em seu habitat natural são a especialidade dessas lentes a partir de 300mm. Imagine você na selva, camuflado, acompanhado da sua humilde 800mm, 4.5kg e uns 50cm de comprimento – com ela, seus olhos estão cinquenta vezes mais perto de objetos distantes. Chuva incessante por três dias e você ali, encharcado até os ossos, à espera de uma chance para fotografar o raríssimo Columbina talpacoti – não existe pressa usando uma super-tele. Finalmente, o pássaro pousa à sua frente. Você faz o enquadramento e se prepara para o clique, nisso a criatura resolve se aproximar. Saltitando chega mais perto. E mais perto. Está a três metros. Girando lentamente o anel de foco para ter a imagem perfeita, você se desespera e percebe que perdeu a foto: o foco mínimo dessa lente é a partir de seis metros. Não adianta perder a paciência e querer quebrar a lente porque ela é mais cara que um carro popular!

Por conta do longo alcance, é fácil traçar similaridades entre essas lentes e… telescópios! Na verdade, elas têm semelhança com os primeiros telescópios baseados no princípio da refração da luz. Ambos, lentes e telescópios, utilizam uma série de elementos ópticos especiais internos que acarretam grande tamanho e peso, além de um alto custo de produção – convenhamos, é um desafio.

Em meados de 1810, os problemas chegam ao fim com W. F. Hamilton e sua patente de uma geringonça que combina espelhos e lentes corretivas numa estrutura incrivelmente mais leve e precisa que os telescópios da época. Surgia ali o que viria a ser chamado de “sistema catadióptrico”, um telescópio baseado não na refração da luz, como os convencionais, mas na reflexão da mesma, com espelhos curvos e reflexos internos. E já que um telescópio nada mais é que uma super-tele, não tardaram a aparecer lentes catadióptricas para câmeras convencionais.

Sua produção é incrivelmente barata – uma 800mm catadióptrica custa, literalmente, um centésimo do valor de uma 800mm convencional – e repleta de vantagens. A lente fica mais curtinha, com 15cm, e pesa menos de um quilo. Graças ao seu sistema de espelhos, aqui são quase nulas as aberrações comuns às fotos feitas com super-teles tradicionais.

O visual de uma catadióptrica é inconfundível: ela é mais gordinha que uma lente normal e tem um círculo preto, saltado pra fora, no meio do elemento frontal. A luz entra e bate no espelho localizado no fundo da lente. De lá, ela é refletida para um espelho menor, que fica atrás da bolinha preta do elemento frontal. Desse segundo espelho ela é lançada para dentro da câmera fotográfica, passando enfim pelos elementos corretivos convencionais, para que a imagem seja projetada sobre o sensor.

Note que pulei um elemento essencial às lentes: a íris, ou abertura. Nas catadióptricas a abertura é fixa. A quantidade de luz que chega ao sensor, é regulada pela relação entre seu diâmetro dianteiro e traseiro. Diferente de uma super-tele tradicional, onde é ajustável a abertura da íris.

Como reconhecer uma foto feita com uma lente catadióptrica? Seria inacreditável se aquele ponto preto no MEIO da lente não mudasse nada, certo? Certo: ele influencia nas áreas de desfoque. Diferente das lentes convencionais, onde o desfoque é redondinho, nessas lentes as luzes desfocadas assumem a forma de “O”, com um espaço “vazio” no centro. Viu isso numa foto? Não tenha dúvida, foi feita usando uma lente dessas! Atente para o o desfoque do céu e das árvores na imagem ao lado.

Agora vamos a uma característica comum entre super-teles tradicionais e catadióptricas. Seu ângulo de visão é bem estreito (menor que dez graus), portanto, é preciso muita estabilidade na hora de fazer a foto. Prender a respiração pode até adiantar num dia muito ensolarado, mas, se não for esse o caso, melhor colocar a câmera num tripé e fazer as coisas devagar.

Ah, quase esqueci de falar: as catadióptricas conseguem fazer foco em objetos bem próximos do fotógrafo. Lembra do Columbina talpacoti? Com uma catadióptrica você teria sua foto.


Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #24, em Agosto/2013

Day-to-Day

UP09 – Slow Shutter

October 5, 2013

Fotografia: um momento eternizado num piscar de olhos. Essa é uma definição comum. Mas, há muito além daí. O objetivo da coluna deste mês é sugerir justamente o contrário: como eternizar, numa única foto, um grande intervalo de tempo. Falaremos aqui da fotografia em baixa velocidade e suas características mui peculiares.

Um bom exemplo desse estilo fotográfico são imagens de rastros de estrelas, nas quais o que se vê são desenhos circulares concêntricos no céu noturno (algo inatingível para nossos olhos nus). Provavelmente você já viu fotos de paisagens onde a água parece macia, “sedosa”, enquanto o resto da imagem aparenta estar normal, ou, então, fotos de grandes ruas ou avenidas desertas em plena luz do dia –onde seria impossível bloquear o acesso de carros ou pedestres para uma fotografia.

Para entender como isso acontece, precisamos primeiro compreender como o filme ou sensor captura as imagens. Ambos são compostos de pequenos pontos sensíveis à luz – chips fotossensíveis no sensor digital, e grãos de sal de prata na película fotográfica – que são excitados de acordo com a intensidade luminosa que incide sobre eles. Se não há nenhuma luz, a imagem é completamente preta. Se não há luz suficiente – seja por fatores controláveis (ISO ou abertura) ou fatores externos (luz disponível) – a imagem fica subexposta, com áreas sem informação. Mas e se houver pequenas fontes de luz e essas fontes se moverem?

Em condições normais, onde o obturador fica aberto por frações de segundo, elas teriam seu movimento congelado, correto? E se prolongarmos esse tempo de ação do obturador? Digamos que, ao invés de abrir e fechar mais rápido que um piscar de olhos, ele fique aberto por vários segundos, minutos, ou mesmo horas, permitindo a passagem de luz pela lente até o sensor. O que acontece então?

Para responder, vamos incialmente investigar o caso dos rastros estelares. Tomemos o céu noturno como preto e as estrelas como pequenas fontes luminosas. O elemento chave a se levar em consideração é o que ocorre durante o tempo de exposição. Move-se a Terra – onde você está, com sua câmera! –, mas, para nossa percepção, o que se move é o Céu com suas estrelas. O sensor exposto por dois ou três segundos já consegue captar e nos mostrar o que nossos olhos não conseguiriam perceber: as estrelas ‘andando’ pelo céu.

Lentes grande angulares atingem os melhores resultados justamente por mostrarem uma ampla paisagem, imóvel durante longo tempo de exposição, combinada ao céu cheio de linhas desenhadas pela luz. O raciocínio é mais ou menos igual para as imagens de água “sedosa”: enquanto o rio corre veloz, as pedras, árvores e plantas que o cercam praticamente não se movem, ficando congeladas na imagem, mas a água em movimento vira um grande borrão macio e agradável aos olhos.

No exemplo de lugares muito movimentados que aparecem desertos em fotos, usa-se a desvantagem desse grande trânsito como uma vantagem na hora de fazer a exposição: o único elemento realmente estático na cena é o ambiente – a rua, postes, prédios e placas. Se você configura a câmera para deixar passar pouca luz pela lente – através da abertura ou de filtros – e define um intervalo longo de exposição, tudo que se move vai ser registrado praticamente invisível ou transparente, justamente por não ter luz suficiente para ativar os chips no sensor. Só o que está parado, durante o tempo de exposição, é que vai refletir luz suficiente para excitar os chips do sensor, ou grãos do filme, e ficar perfeitamente registrado na fotografia.

Importante ressaltar que também a câmera deve ficar completamente imóvel durante o tempo de captura. Um tripé de verdade, ou apoio equivalente, é fundamental para a produção de imagens desse tipo. Qualquer tremidinha, por menor que seja, vai borrar os elementos da cena que deveriam estar estáticos.

Caso resolva experimentar a fotografia em baixa velocidade, lembre-se de fazer testes de curta duração e gradualmente ouse aumentar o tempo de exposição a partir de seus resultados. Não é recomendável começar com grandes intervalos de tempo, pois há muitas variáveis em jogo e você precisará de tempo para aprender a ajustar cada uma delas.

Fotografia é usar a luz para contar histórias. Às vezes rápidas, como um piscar de olhos, às vezes longas, como mil e uma noites.


Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #23, em Julho/2013

Day-to-Day

UP08 – MagicLantern

September 28, 2013

Imagine que você esteja comprando um projetor. Você lê a lista de recursos oferecidos pelo aparelho, fuça todos os menus, configura a máquina de acordo com sua preferência e fica feliz com o resultado. Dali a duas semanas, um amigo te convida para dar uma olhada em um projetor novo que ele também comprou. Chegando lá, você percebe que o aparato está em outro nível. Imagens mais definidas, menor consumo de energia, muitas outras configurações, o diabo do aparelho consegue até projetar hologramas no ar! Espantado, você comenta com seu amigo: “Deve ter sido uma nota! Qual o modelo?”. Nessa parte, seu queixo vai até o chão: o modelo é exatamente igual ao seu. “Qual a diferença então?” Seu amigo explica que instalou um programa alternativo, que roda por cima do original da fábrica, habilitando muitas melhorias ocultas.

É mais ou menos isso o que o firmware alternativo Magic Lantern faz com muitas câmeras Canon. Um grupo de hackers e programadores começou a fuçar o código fonte das máquinas em meados de 2009 e rapidamente conquistaram algumas vantagens sobre o firmware original. De 2009 para cá, aumentou o número de desenvolvedores e de usuários, e os recursos estão bem mais trabalhados. Nas últimas semanas o Magic Lantern apareceu em inúmeros blogs e sites de tecnologia, por ter habilitado vídeo RAW em boa parte das Canon disponíveis.

Mas como funciona essa coisa? Seguindo as diretrizes legais da internet, todo o código usado no programa é original e completamente aberto para quem quiser estudar ou propor alterações. Os criadores não utilizam qualquer programação da Canon justamente por ser código proprietário – que poderia colocá-los em maus lençóis de processos por pirataria e roubo de informação. O que é utilizado, na realidade, são funções que a própria Canon colocou nas câmeras, mas não constam nos menus do aparelho.

Muitas vezes, funções são combinadas em uma única aplicação, simplificando bastante processos, como por exemplo timelapses. Graças ao Magic Lantern, a própria câmera define os intervalos entre as imagens, o tempo de exposição adequado, além do número de fotos a serem feitas – sem gastar o mecanismo do obturador – e oferece playback do resultado em vídeo. Sem o programinha, são necessários acessórios extras, muitos cálculos elaborados e algum tempo no computador para conseguir visualizar decentemente as imagens sequenciadas.

O grupo é bastante responsável e só lança versões novas depois que todos os recursos foram testados exaustivamente por voluntários e quaisquer os errinhos de programação tenham sido corrigidos. Sem esse cuidado, aumentam as chances de usuários menos experientes danificarem suas câmeras, ou mesmo as margens para publicidade negativa, justamente por conta de bugs.

O software é gratuito, e pode ser encontrado em seu site oficial (www.magiclantern.fm). Vale lembrar que mesmo sendo bastante testado, é sempre possível que algum erro aconteça, ou a câmera faça algo estranho de vez em quando, devido ao programa. A garantia da Canon não cobre máquinas danificadas pelo uso da modificação (ainda assim, não há casos de dano permanente), e já anunciou que vai ativar sua equipe de advogados caso os programadores tentem mexer nos modelos do topo da linha, a série 1D e EOS Cinema.

No site do programa é possível encontrar uma lista com os modelos compatíveis e recursos habilitados em cada câmera. Encontra-se também a versão oficial para download e instalação, versões de teste para alguns modelos e versões ainda menos estáveis, com as novidades diárias da equipe. Um dos maiores méritos da comunidade é que todos aqueles que encontram uma forma de contribuir, contribuem: sugestões, testes, boletins automáticos gerados pela câmera ou mesmo funções originais no formato de código. Tudo é lido e respondido com prontidão, por uma equipe que não ganha dinheiro com esse projeto.

Se você já dominou tudo que sua Canon tem a oferecer e quer ultrapassar esse limite, recomendo fortemente a experiência com o firmware alternativo. É saudável seguir os passos indicados durante a instalação, e depois disso, acessar o fórum para tirar dúvidas, ler a documentação de cada recurso (todos aqueles presentes nos lançamentos oficiais são bem explicadinhos) e ficar por dentro das novidades. A modificação traz grandes vantagens para ambos os modos, de foto e de vídeo!


Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #22, em Junho/2013